Memórias: lembranças que eternizam*

O corpo e a mente, enquanto totalidade, se colocam como sede de registros. Ah como agradeço a natureza sua sabedoria em lapidar minha espécie com tamanha potência! Pois quando olho para o mar vejo os dias que corri com as crianças sobre a areia quente e úmida. Ao passar pelo passeio público rememoro os encontros ternos com os poucos amigos que já não mais vejo. O cheiro do maracujá me remete ao perfume usado pelo meu grande ídolo, avô que dá Terra se despediu. A canção que, até hoje, ainda escuto nas noites frias, presentifica o namoro que foi eterno enquanto durou. A leitura comum e trivial ,num domingo pela tarde, faz meu corpo todo sentir o entrelaçar das mãos, que um dia se colocaram como objetos de afago e carinho, num compromisso entre dois seres que se dispuseram à paixão . Pensando em todas essas coisas, chego a conclusão de que o espetacular , em dar e extrair sentido de tudo que existe no mundo, é que a gente transforma a perda em lembrança, o passado em continuum. Por isso, Perdoem-me alguns filósofos e céticos, mas vejo beleza no passado, pois olhar para trás não é recuar: é contenplar os fios que teceram a vida que pulsa em mim; é eternizar aquilo que fez marca e registro num corpo vivo; é (re)viver legitimando os gestos, sorrisos, abraços, olhares e palavras, que, em seu conjunto, me compuseram e conduziram. Tudo que passou por mim está em mim! e ficará, também, naqueles que comigo se encontraram, encontram e encontrarão neste espaço chamado vida. Espinosa já dizia: corpos se afetam, e alguns encontros compõem aumentando a potência de vida. Outros, apesar de comporem, se desencontram no caminho: sempre haverá intercorrências! Encontro produz, portanto, memória e, por conseguinte , faz a vida continuar seu fluxo, mesmo quando alguns corpos se transformam em outros, afinal no mundo o que opera é a mudança, a própria físico-química atesta isso. "Que seja eterno enquanto dure" e eu afirmo :que seja para sempre desde que haja pensamento e afeto.