Queria viver o presente

Pisco os olhos que não se fecham a mais 32 horas e o peso das pálpebras ardidas do pranto pesa tanto quanto a dor de estar sozinha. Sinto falta de sentir na pele a concretude de não viver só de passado. Sinto falta de sentir a vida correndo pelas veias tal qual uma droga que deixa o corpo e a mente em êxtase. Eu sinto falta de sentir, de presenciar algo aqui dentro que não seja esse vazio.

E não importa o que eu faça, a vontade de morrer me abraça como me abraçava nos domingos pós-festa e bebedeira. E, ultimamente, todo dia me parece domingo.

A falta de motivação e o bloqueio criativo fazem eu me sentir ainda mais inútil. E como se não bastasse, pandemia. E como se não bastasse, quarentena.

Há um tempo atrás pelo menos eu podia fingir não estar sozinha de vez em quando. Podia fingir ter amigos e fingir que estava me divertindo enquanto bebia pra acalmar e calar meus demônios por algumas horas.

E mesmo não gostando tanto de social, hoje senti que precisava ver gente. Eu queria conversar com gente bêbada, beber um vinho com desconhecidos, falar sobre um filme ou sobre a nova descoberta da NASA, tanto faz, trocar um pouco de afeto. Mas as pessoas parecem estar tão distantes. Se escondem atrás dos seus celulares, de janelas e de portas fechadas com medo de algo que nem mesmo podem ver. Cada um com seus problemas, cada um tentando passar por isso como pode e a maioria sofrendo. E eu me recuso a pegar o celular, digitar sobre toda a minha angústia e clicar em "enviar mais um problema" àqueles que ainda tenho contato.

Me vejo obrigada a encarar o meu caos, frente a frente.

Até quando vou ter que ficar presa em casa na companhia dos erros que cometi e que ecoam na minha mente? Até quando vou aguentar viver só de lembranças daqueles que me fazem bem? Até quando vou ter que viver de passado?

Angelica Stefaniak
Enviado por Angelica Stefaniak em 25/05/2020
Reeditado em 23/07/2020
Código do texto: T6958254
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