Para melhorar o mundo 2

Na data de ontem houve uma resposta ao seguinte trecho do meu livro:

“Para melhorar o mundo”.

Seria necessário que tal pessoa ou grupo conseguisse conhecer tudo que há para conhecer e aprender tudo que há para aprender de forma a analisar todas as possibilidades. Ninguém pode melhorar aquilo que não compreende. Obviamente esta é uma obra impossível de se realizar por alguém que, além de estar dentro da realidade que precisa compreender, tem um tempo limitado para fazê-lo. Para se ter o conhecimento de toda a existência é necessário estar acima desta existência. Quem busca fazer isso é como um peixe que busca dizer como o oceano deveria ser. Somente seria possível terminar tal tarefa estando-se fora do mundo e tendo a vida eterna. Somente seria possível concluir esta tarefa se fosse Deus. E por que não acreditar que Deus já fez isso e que o mundo já é o melhor possível? Os materialistas, ao contrário, não somente apagam Deus, mas buscam assumir o seu lugar de Redentor do mundo. Por isso os chamamos de utópicos, porque utopia quer dizer “em lugar nenhum”. Os utópicos estão cassando fantasmas que, no fundo, sabem não existir. Porém a posição materialista precisa desta mentira para não tornar-se insustentável. Logo, melhor ser utópico que louco, ainda que, no fim, signifique a mesma coisa.

A resposta que recebi:

Douglas, o materialismo não é a única corrente que critica uma vida orientada em valores que estão fora do nosso mundo. Normalmente o espiritismo kardequiano é que construiu esta dicotomia porque Kardec assim chamava toda corrente que não trabalha com transcendência. O mundo precisa sim de mudanças, está repleto de injustiças. Há guerras, há fome, há angústia, desespero e maldade. Há problemas que são reais e não apenas fruto de imaginações entediadas querendo se rebelar com Deus. A maioria dos cientistas, filósofos e pensadores inclusive acreditam em Deus. Só não acreditam que devem sentar e esperar Deus mudar o mundo pra gente. Não podemos achar que o mundo está perfeito só porque administramos bem os nossos problemas. Há problemas terríveis assolando as pessoas.

Outra coisa. Você está certo: ninguém muda o mundo, ninguém tem conhecimento de tudo e nem poder para tamanha empreitada. É por isso que a mudança do mundo não é um feito de heroísmo de indivíduos, sua perfeição foi primorosa neste ponto. Contudo, mudamos o mundo enquanto esforço coletivo. É o trabalho diário, o debate saudável, honesto e respeitoso (como este nosso) que nos faz avançar enquanto humanidade, de pouquinho em pouquinho, denunciando a injustiça, reconhecendo os erros e propondo soluções. Mas é sempre coletivo. É a multidão de anônimos que movimenta e evolui o mundo.

Eis minha resposta. Obviamente o entendimento do que eu quis dizer foi prejudicado pelo fato de ter postado apenas um trecho. Se o Leitor tivesse acesso ao resto da argumentação veria que não digo que tudo está bem, mas que a proposta marxista é um erro.

Primeiramente, toda corrente que critica a vida de valores extramundanos é necessariamente materialista porque está sempre negando os aspectos imateriais e é materialista neste ponto, não materialista no sentido de grupo de ação coletiva. Não estava falando do materialismo como grupo político ou doutrina, mas como definição daquele que nega a transcendência.

Segundo, o espiritismo kardecista não criou dicotomia nenhuma entre transcendência e não transcendência. Esta dicotomia existe desde, pelo menos, Sócrates com seu mundo material e mundo dos arquétipos. Jesus mesmo disse dai a César o que é de César e a Deus o que é de Deus. Como ele poderia ter dito isto sem uma dicotomia entre estas duas realidades. O próprio Santo Agostinho escreveu um livro chamado “Cidade de Deus”, onde descrevia o mundo terreno dos homens e o mundo espiritual dos céus. Como ele poderia falar de uma dicotomia criada pelo kardecismo?

Terceiro, dentro do ponto de vista que defendo aponto que estes problemas apontados não estão no mundo, mas nas pessoas e qualquer um pode ver que “mudar o mundo” é apenas um eufemismo que acaba por afastar da percepção a responsabilidade individual do ser. Você raramente tem a capacidade de resolver os problemas do seu vizinho, quanto mais de toda a sociedade. Expressões como “seja a mudança que você quer ver no mundo” e “estou começando pelo homem no espelho” refletem precisamente a realidade. Devemos sim procurar não somente a mudança, mas a melhoria e devemos aplicar esta melhoria sobre a nossa própria jurisdição obrigatoriamente. Podemos tentar convencer outras pessoas a fazer também esta mudança, mas não podemos obrigá-la. Ela tem que aderir e esta adesão não é senão individual.

Quarto, justamente, toda ação grupal é nada mais que a ação de diversos indivíduos na mesma direção. O problema do foco em ações coletivas é que os objetivos têm que ser definidos por alguém ou alguns. Seguir um grupo significa necessariamente abrir mão do exame individual das situações. Liberdade e igualdade são antônimos. Uma ação coletiva somente pode acontecer quando várias pessoas aceitam a soberania da opinião grupal sobre a sua. E aí voltamos ao início, toda ação grupal é fruto da adesão individual de cada membro. Neste ponto precisamos escolher com cuidado a quem damos credibilidade, até porque, a única forma de liberdade real é a adesão à autoridade suprema representada na terra pela Santa Igreja Católica.

Por último, não podemos denunciara injustiça, reconhecermos erros e propor soluções sem saber qual o modelos ideal. A confusão é tanta hoje justamente porque os critérios para reconhecer os problemas estão todos bagunçados. Precisamos retornar aos princípios e os princípios são os 10 mandamentos. Eles são a chave interpretativa que nos permite contrastar o atual com o ideal. Julgar os casos concretos já é difícil se temos os princípios. Sem os princípios tudo se torna loucura porque, desde a popularização do exame individual, cada um julga os casos concretos conforme os próprios princípios e isto é a mais exata definição de caos. Nenhum debate vai restaurar isto sem a intenção individual de cada ser buscando sinceramente a verdade com humildade e respeito, logo, o problema é muito mais profundo do que o simples diálogo e ação coletiva. E este retorno aos princípios deve partir de cada ser individualmente, dentro da consciência, justamente porque obrigar seria tolher-lhes a liberdade, o que é uma maldade por si só. Ou seja, a única ação coletiva eficiente somente acontece sob a autoridade que menos obriga e que concede a maior liberdade e somente pode acontecer pela adesão voluntária individual à herança deixada na terra pelo Verbo Encarnado.

Ps. Evolução e melhoria não

são sinônimos. Evolução é devir, desenrolar, apenas.

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