Uma mão e mais nada
Eu me lembro do hospital
E como não poderia?
Aquela mão escapando pelos lençóis
Agraciada por tantos pores de sol
Por tanto passar de horas
chamando um nome que eu não conhecia
Nos seus olhos,
algo para além dos meus ombros
Uma busca
Uma valsa não dançada
Em algum canto de sua adolescência
Outra vez se sentiu tão mal
A maquiagem se desfazia
Tão sozinha
e acreditando ser indigna de ser amada
Mas também um ótimo dia
Deitada no telhado do vizinho
Enquanto falava sobre algo nas estrelas com alguém
E voltava para casa com um sorriso contido no rosto
O som das chaves tilintando
do abraço de sua mãe
O cheiro inesquecível e aconchegante
Até mesmo quando se foi
E teve que se desfazer de suas roupas
Sem conseguir
até que o cheiro, aos poucos, deixasse a casa
Sua boca balbuciava
provavelmente uma história
Ou seria um conselho?
Ou não seria nada?
Mesmo assim eu escutei
Minha mão a alcançou
Até que as primeiras palavras
começaram a sair
Até que eu voltaria lá por tantas vezes
ainda querendo ouvir
Aquele olhar gentil
De quem viveu o suficiente para ter sabedoria
E se inundasse de amor
E eu voltaria tantas vezes
Até que houvesse apenas uma maca forrada
E uma enfermeira me esperando com a notícia
E eu saberia
Que ela conseguiu chegar até a lua
Como prometeu em uma brincadeira
No quintal de sua antiga casa
Olhando para as estrelas
E mais nada.