A Humanidade

As pessoas costumam dizer: “seja diferente!”, quando na verdade querem dizer: “seja diferente sendo igual a mim!”. E continuam após uma risada: “e assim, outros serão iguais a nós, e em breve seremos todo mundo”. Esta é a conclusão dos comerciantes. Os comerciantes vendem idéias e conceitos como estes. E não têm pudor de usar palavras que outrora representaram os mais altos ideais. Assim é com aquela a que chamam “Liberdade”. Talvez numa época distante a liberdade fosse a espada dos guerreiros, fosse a pena dos poetas, fosse o poder de Deus. Hoje é apenas prostituta para os vendedores, e coisa muito pior para os governantes. “Nós temos a felicidade”, berram os feirantes, pois as pessoas não sabem o que é felicidade. Então correm a comprar e dão uma grande risada. E então concluem: “nós somos a humanidade!”, porque ouviram alguém falar assim. Não sois humanidade, infelizes! Sois apenas uma multidão. Regozijai-vos do vosso passado e esqueceis que chegastes aonde chegastes mais por tropeços e quedas do que por altos vôos. E ainda assim, não chegastes muito longe. Por isso vos exorto para a solidão meus amigos. Para os desertos, para as florestas, para as montanhas, para o horizonte! Quanto maior a aglomeração, mais baixo o nível mental. Que a revolução, ou seja lá o que for, comece em cada um de vós e num movimento natural como de um rio, alcance o grande oceano chamado “multidão”, e que chama a si mesmo de “humanidade”. E não vos enganeis mais com os comerciantes. Ignorais que eles são escravagistas e mágicos perversos? Vendem a imagem do homem perfeito, sabendo que tal coisa não existe, o homem. Vendem o dia de amanhã e nem sequer o hoje ainda existe. Não deis ouvidos também àqueles que se gabam da “cultura”! Freqüentemente é um Necromante que vos fala. Nada além de plantação e criação de animais deve ser chamado de cultura. De resto, são apenas ossos e carne apodrecida que jogam sobre vós. Sem falar nos fantasmas que não vos deixam dormir à noite! E a toda esta imundície vós comeis e arrotais felizes: “cultura!”. Lede os bons livros, escutai a boa música, mas não faleis em cultura. Deixai os papagaios falarem sobre ela. Mas ainda dizeis: “felizes são os lobos e as raposas!”, porque foram ensinados a repetir isso e vos esqueceis que sois apenas ovelhas. Esperais então o bom pastor, e ele chega falando em “liberdade”. Mas esqueceis que ainda sois apenas ovelhas, uma multidão delas.