UM PIANO

Moro no terceiro andar de um prédio e, hoje de manhã, enquanto tomava café, ouvi um vozerio que vinha do pátio do apartamento que hoje chamam eufemisticamente de “Garden”. Logo após ouvir esse alarido, tomei um susto ao ver, passando pela minha janela, um piano embalado em plástico e amarrado com cordas, sendo içado para a cobertura, onde o vizinho está a fazer uma reforma.

Convenhamos, o objeto em questão é uma peça delicada que pode produzir música da melhor qualidade porém, neste caso, um trambolho que não passa pelas escadas e nem cabe no elevador. Içar esse equipamento para o sétimo andar requer perícia, esforço e boa dose de sorte para evitar avarias, quer no próprio objeto ou nas paredes. Ainda necessita de paciência e boa vontade do proprietário do térreo em ceder sua área descoberta para tal operação.

Mudanças e reformas são, na maioria das vezes, vistas com certa desconfiança pelos vizinhos. As últimas, então, são as campeãs de reclamações. Embora as Normas Internas estipulem horários para quebra de paredes ou pisos, barulho e, também, para movimentação de materiais de construção e remoção de entulhos, nem sempre são respeitadas.

Durante a Pandemia tivemos um apartamento todo sendo reformado. Imaginem, as pessoas em casa, trabalhando em Home Office, crianças tendo aulas online, todos já enfrentando grande stress devido ao isolamento forçado e a barulhada nos atormentando grande parte do dia. Um desgaste enorme que suscitou bate-bocas e justificadas reclamações. O Síndico quase enlouqueceu.

Por tudo isso, detesto reformas e somente as faço quando imprescindíveis. A sujeira que causam é outro motivo de muito desagrado de todos, principalmente do zelador, pois o entulho tem que percorrer um longo caminho até a caçamba na rua e vai deixando um rastro por onde passa.

Porém, um piano, de manhã cedo, no meu sky-line, foi demais.