Correnteza
E eis que às duas horas da manhã de um morno e indecifrável Outono — eis que me encontro em estado de uma igualmente morna e indecifrável excitação mental. Há algo que me impele para o desassossego, para a dúvida e o desencanto. Mas há também alguma coisa a manter-me cuidadosamente estático e espantado, como um cervo diante da iminente emboscada de um lobo. E tenho um pouco de medo dessas formas que meus instintos adquirem — assusta-me o fato de que isso se pareça com uma prazerosa e instigante angústia, ao mesmo tempo em que se assemelha ao sutil devaneio provocado por um sonho interrompido. Que há comigo? Que é esse sentimento que ora me alarga até o limite da imaginação, ora me sufoca debaixo das sombras de um irresistível cansaço? Parece obra de feitiçaria. Mas também parece ser "coisa da minha cabeça". Seja o que for, não há remédio, tampouco resposta que aplaque a incerteza. O jeito é — silenciosamente — entregar-se ao instante, sem medo de perder-se na sua interminável correnteza.