A m(eu) jovem poeta

A m(eu) jovem poeta

São José, SC, 29/06/2023, 08h10

Não romantizes teu sofrimento, jovem poeta. Proseies mais contigo mesmo, deixa de lado a métrica, o ritmo, a rima, e te apega ao fluxo, à catarse, ao catar-se, ao cabralino catar feijão do que é cisco, cisma e cisne. Não dialogues tanto por meio de intertextualidades premeditadas, porque em teu diário teus pensamentos devem ser primeiramente teus e de dentro para fora, só então poderás reabsorvê-los de fora para dentro reorganizando-os, relendo-os, reconectando-os. Do pó vieste e ao pó voltarás, é certo, mas no meio do caminho há pedra, papel e tesoura, não perde a chance de acolher ludicamente tua criança interna. Por meio do jogo ela dispõe de vez e voz, estejas atento aos sinais de quando ela precisa beber água, alongar-se, aquietar-se, dormir. Se tiveres dois cuidados contigo e com os outros, se usares as três peneiras nas palavras que te circundam, se fores capaz de plantar a flor e o trigo e colher o pão e a poesia, se puderes estudar um pouco de estoicismo sem perder tua identidade, tua fé, faz isso. Se não puderes ser uma presença amiga, não sejas uma presença inimiga. Acrescenta em teu diário palavras-chaves que te abram portas para boas experiências, sentimentos, pensamentos, diálogos. Lembra-te de que dialogar é fazer login com o dia, é fazer login entre duas pessoas, é dividir para multiplicar, então não procures te expandir apenas por dentro, porque viver para dentro é monólogo, login com monotonia, monótono até logo. Anta, mais uma vez, em teu diário, que todo ser é vário e varia, porque é com várias notas que se compõe uma melodia. E assim, mais tarde, quando puderes, revisita o que escreveste em teu caderno, e verás que vale muito mais ser infinito enquanto dure, do que romantizar o que poderia ter sido (e não foi) eterno. Acolhe a dor do outro em teu diário também, não só no diário, mas diariamente em ti mesmo, e se não puderes ajudar em algum momento, ao menos mantém a empatia. Toda vida é sagrada e sangra. Por hora, m(eu) jovem poeta, é o que tenho a te dizer, agora põe de novo a coluna ereta, toma café e te organiza sobre o que fazer.