AS MÃOS QUE CONSTRÓEM

Somos seres movidos pelo trabalho incessante, edificando sociedades complexas movidos a ideais, pensamentos, sonhos e utopias concretizando realidades e experiências diversas. Desde os primórdios da humanidade somos munidos por algo singelo e poderoso que nos distinguiu das outras espécies, propiciando o surgimento das culturas e das sociedades. O movimento de pinça entre o dedo indicador e polegar foi a base para os movimentos de motricidade fina, a delicadeza dos atos na produção material do cotidiano. A produção de artefatos líticos que facilitaram a vida e a relação com o meio natural é a prova destes gestos e técnicas. As mãos são especiais no conjunto do corpo humano e mesmo sem elas a inventividade humana se adapta de maneira incrível e supera as adversidades que possam surgir. Minha querida “mainha” (como se chamam as mães no nordeste do Brasil e minha mãe é oriunda de uma família de retirantes nordestina, especificamente do Maranhão) sempre me fez observar os detalhes da vida e do corpo humano, em especial os pés e as mãos que nos sustentam e nos propiciam a construção dos nossos objetivos. As nossas mãos excepcionalmente evoluídas dos primatas, representam nossas ações e atitudes e a materialização de nossas intenções. As mãos que representam as mais profundas intenções de nossa evolução. Por essa sensibilização herdada pelo meio familiar, sempre foi algo que me interessou. Seja as pessoas com alguma deficiência física que acabam de alguma forma se adaptam e nos surpreendendo com a capacidade de inovação e criatividade. Sempre, de alguma forma, conseguimos superar os obstáculos e desafios que são impostos pelo cotidiano. A sociedade e o planejamento urbano deve garantir os direitos das pessoas com deficiência física ou cognitiva, pois somos seres, ou sujeitos, protagonistas de suas próprias trajetórias de vida.

As mãos, muitas vezes passam despercebidas em nosso cotidiano, mas são fundamentais em nossas vidas. Escrevemos, devotamos amor e carinho, ou até mesmo representam momentos de raiva. Existem pessoas que leem nossas mãos e estabelecem o destino, ou apenas caminham de mãos dadas e sonham com um futuro promissor. Trabalhamos e nos alimentamos, nos expressamos pelas mãos e o mais significativo, construímos e nos espelhamos por esta parte do corpo. Colocamos alianças, fazemos juramentos e nos colocamos perante o mundo

Uma experiência de exercício da cidadania que me trouxe profundas reflexões foi nas últimas eleições quando fui convocado para mesário. Neste momento, auxiliando os eleitores, fiquei observando suas mãos e como elas representam quem somos. Mãos de trabalhadores da construção civil, agricultores, médicos, advogados, empregadas domésticas, donas de casa, estudantes, aposentados e uma infinidade de pessoas e suas respectivas ocupações. Dentre, algumas tive a oportunidade de presenciar uma cena inusitada. Um senhor se aproximou para o reconhecimento biométrico e dava erro na sua digital, solicitei que colocasse o dedo indicador e ele sorriu, mostrando que faltava a falange do dedo. Fiquei tão surpreso que apenas gargalhei e juntos apreciamos aquela cena cômica na seção eleitoral. Podemos nos divertir depois de um trauma e a partir dali compartilhar histórias.

Nossas mãos representam a simbologia do trabalho, a união e a solidariedade. Na ajuda humanitária nas regiões que foram atingidas pelas enchentes , levam afeto, carinho, alimentos e esperança na reconstrução dos lares e das cidades. Escrevemos nossas histórias cada um a sua maneira, assim como meus alunos e alunas reescrevem seu devir, sejam destros ou canhotos com afinco e sede pelo saber. Nos processos de mudanças nossa verdadeira digital é o ímpeto pela vivência do inimaginável.

Leonardo Gedeon
Enviado por Leonardo Gedeon em 03/10/2023
Reeditado em 05/10/2023
Código do texto: T7900602
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