Grito tardio !

e agora...

como o lázaro e o mendigo

me vejo assombrado

choro e grito com razão,

pois estou condenado

ó mendigo sofrido

perdoa por não te amar

e por tuas feridas expostas não

preocupar-me em curar...

eu era ferido de grande chaga

mas não podia identificar

pois meu dinheiro e abrigo

me impediam de enxergar

a avareza, egoísmo e miséria

que havia em meu lar

espiritualmente inerte

vivi a vagar

a ninguém ajudei

pois não soube valorizar

os que a mim Deus enviou

para consolar...

Agora gemo e sei

onde foi que eu errei

Deus meu tu estavas lá

por trás de cada caído que menosprezei

no meu caminhar

Senhor tu estavas ali

experimentando o meu coração

arrogante e prepotente

que negara inclinar-se ao menino doente

que gemera impotente

Eu não te enxerguei mas Tu oh Santo

sempre estiveste perto de mim

mas sua aparência era tão suja que te repudiei

teu olhar era tão necessitado que esmiucei

tua voz tão fraca que a sufoquei

Eu me achava tão pronto

tão rico

tão capaz

que não pensei que em ti um rapaz

de trinta e três anos

teria adquirido o perdão

quebrantamento e amor

que me diferenciaria de um bandido

mas a frieza que a minha alma traz

tornou-me um combalido

Vieste ao mundo muito simples

e fraco

não consegui imaginar

que teus valores eram outros

grandes demais para eu valorizar

foste muito doce

em seu caminhar

não via em ti um líder apropriado

para me guiar

fui criado com fartura

força e prepotência

estas eram a marca

que revelavam a minha essência

mas tu tão pobre

e amigo

dos fracos e oprimidos

confrontaste com meus discursos

opressores e imprimidos

pelo intelecto e cobiça adquirido

no meu convívio carnal e promíscuo

Eis-me aqui

só e tão quebrantado

não imaginava que alguém

algum dia pudesse me deixar assim

prostrado, humilhado dentro de mim

Jesus eu não imaginava que tudo teria um fim

briguei, pisei nos mais fracos que rodeavam-me

foi assim que cresci aprendendo a ser inabalável

sem coração e alma

afligi o miserável , carente enfim

não aprendi que devia respeito a eles

tão sujos e repelentes

mendigos, pobres e inconvenientes

fracos, ignorantes e incompetentes

Tu mesmo vieste tão humano e sem abrigo

que gerou em mim grandes conflitos

tua misericórdia e amor

contradiziam todo meu valor

pessoal e exclusivo

agora aqui estou

como o lázaro com o mendigo

choro e gemo de pavor

pelo que ocorrerá comigo

vejo diante de mim um abismo

e uma densa escuridão

que provêm do meu coração

corrupto e arrogante

que sempre comandára-me

de forma inexcrupulosa

manipuladora e triste

e muitas vezes raivosa

entristeci a muitos, fiz sofrer

acusei e agredi

aqueles que ousaram me fazer crer

Jesus agora que te vejo

em teu trono como Deus

tremo, me amarguro

e padeço como ateu

egoísta que fui

não vi os olhos teus

querendo quebrantar

todos os sofismas meus

apegado em tradições

religiões e crendices

não vi que era o senhor

desnudo que pediste

um manto para que eu te cobrisse

apegado as minhas vãos filosofias

não vi que era o senhor que me pedia

um prato de comida

e um copo de bebida

aprisionado pelas seitas e rituais

não matei a tua sede nem te visitei nos hospitais

pedir perdão não conseguia

pois afinal fazia o que eu podia

Vivi em torno de mim

e dos meus amigos contadores

de piadas de preconceito

daqueles que pastavam sem amores

mas enfim não entendia

que um dia morreria

e tenho um espírito eterno

que agora merece o inferno

aceito e concordo com esta sentença

pois não sou digno de favores

diante da vida que vivi

das minhas práticas e dissabores

nunca olhei a área espiritual

menos ainda seus valores

Agora é tarde demais para mim

sentenciado estou pela eternidade sem fim!