Uma pausa na política para falar de amor

“Olha, minha filha. Hoje, ela é feliz, mas será que amanhã continuará a sê-lo?" - Balzac, "Mulher de 30 anos"

 

Uma pausa na política para falar sobre as coisas do coração. Ando bem cético em relação à pessoa que amo; ela está cada vez mais distante. A imagem dela está tão deformada em minha memória que já nem lembro mais do seu rosto. Será que ela já tem outra pessoa? E mesmo se não tiver, como irei concorrer com seus pretendentes? Eu, com minha aparência comezinha, minha inteligência acanhada, minha apatia. Como irei competir com doutores bem-apessoados, bem-sucedidos, inteligentes e bem-dispostos com a vida? Bem verdade que eu me acho uma boa companhia para as pessoas e alguém interessante. Mas será que isso basta? É verdade também que doutores não costumam ser muito interessantes. Pelo menos eu não fui apresentado a algum (além da pessoa que amo), mas pode haver algum unicórnio por aí. Bem verdade que a pessoa que amo nem deve conhecer no convívio dela pessoas iguais a mim, falo de aparência mesmo. E com isso, quero dizer pessoas moreninhas como eu, a não ser se ela conhecer alguma serviçal. Essa é a verdade. Somos muito diferentes. Mesmo com todas essas distâncias entre nós, eu mantenho um certo otimismo, não sei de onde, e sinto que temos uma conexão inexplicável. Também sei que, mesmo eu não sendo ideal, dificilmente ela irá encontrar alguém que tenha demonstrado os sentimentos por ela da maneira que eu demonstrei. Nem imagino o que de fato ela acha de mim; o sentimento que tenho é que ela age com uma nítida superioridade em relação a mim. E ela tem certa razão. Ela me vê como uma pessoa que não merece sequer um 'oi'. Sinceramente, não me enxergo como uma pessoa tão desprezível assim. É claro que, se pudesse, eu mudaria algumas coisas. Por exemplo, quando eu era adolescente, meu treinador de futebol disse que, se eu fosse disciplinado, poderia chegar a ser jogador profissional. E o que eu fiz com essa declaração? Você acha que me motivei? Pelo contrário, desisti de vez do futebol. E também, se eu fosse mais disciplinado e menos displicente, poderia ter chegado longe. Mas, pelo contrário, sou um tanto quanto inerte e apático. E sinto um sono fora do normal. E mesmo nas atividades que gosto de fazer, como ler, não sou dedicado tanto assim. Se tivesse disposição, poderia ser um bom intelectual. Sempre senti vontade de ser intelectual, viver das minhas ideias e escritos, mas inabilmente jamais li nem um terço das obras obrigatórias para saber o mínimo e não ser um ignorante. E se já me destaquei em algum momento na minha vida, é muito mais por deficiência dos outros do que méritos próprios. Sobre meu futuro, o que posso dizer? A única coisa que posso falar a respeito é que hoje eu sou feliz, mas será que amanhã continuarei a sê-lo?

Dave Le Dave II
Enviado por Dave Le Dave II em 28/02/2024
Reeditado em 29/02/2024
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