Você quer saber?

A verdade é que na primeira semana eu tentei viver numa realidade paralela em que não precisaria te mandar mais mensagem e nem me preocupar se vc mandou. Fiquei mais relaxada com o celular. Minha ansiedade acalmou. Me senti aterrizar e senti o chão nos meus dedos dos pés. Evitei ficar sozinha nos cômodos da minha casa. Todo silêncio era como abrir espaço pra sua voz. Pras coisas doloridas que já me disse, para as brigas, desrespeitos. Sim, me senti desrespeitada, questionada. Estava em hiper vigilância, me preparando para a próxima defesa, pra me arrancar um pedaço de pele e te mostrar que não há nada perigoso ou destrutivo debaixo dela. Doía. Conversas e falas ensurdecedoras, repetições sem fim, parecia um tanque e a água já estava na minha garganta e o teto parecia que ficava mais baixo. Ao mesmo tempo que sentia o alívio em não ter que tirar mais pele, nem te mostrar mais nada, vem também, nesse silêncio, flashes dos momentos de calma, de acolhimento, de carinho, de risada, de toque, de abraço, de companheirismo e todas as vezes que fui até sua casa. A sua indecisão sobre a minha presença, sobre mim, sobre a gente. As palavras e sentimentos não ditos, as amarguras e mágoas. Percebo hoje que tudo o que você tinha medo que viria de mim veio, na verdade, de você. Você me pegou de surpresa com suas mágoas, incômodos não comunicados; você não se deixou ser vulnerável, quis ser forte, quis ser algo que achou que eu merecia e que, no fim, você não foi você mesmo. Você me ocultou dúvidas, você que me deixou de surpresa, de relance. Não me passava a segurança se eu era desejada, querida ou amada. As palavras diziam essas coisas, mas as atitudes, muitas vezes não. No entanto, eu ia, eu me planejava, eu perguntava, eu batia na porta. Você tinha medo da gente nunca mais se falar, de eu sumir, mas você é quem me bloqueou, você é quem me tirou das suas redes sociais. O quanto queria minha presença? O quanto fazia questão de mim? Parece que eram só palavras.

Como você se esforçou pra me trazer segurança?

E quando eu perguntava suas motivações, você nunca sabia explicar, era tudo muito óbvio os seus motivos, os porquês…já eu, as minhas justificativas pareciam nunca te convencer. Por que eu sempre tinha que te convencer de algo?

Instável nos desejos, nas ações, nas falas. Mudou o comportamento comigo diversas vezes sem eu saber porquê. Desligou o telefone porque estava desconfortável com as minhas falas. Não conseguiu ser sincero quando era preciso, mas sempre me cobrou isso. Me sentia culpada se eu precisasse do meu espaço, se eu não desse ou soubesse a resposta. Mas nunca se preocupou em me dar o mesmo, em dar as respostas quando eu pedia. Sempre respeitei seu espaço. Sempre quis te compreender. O meu amor fez força pra abandonar o julgamento e todas as possíveis bandeiras vermelhas porque eu queria te compreender. Não queria julgar, não queria decretar o que parecia claro, afinal, quis abrir mão das minhas convicções por saber que não sei tudo, por entender minha visão enviesada da realidade. Reconheci minha limitação sobre o mundo e as pessoas, não queria decretar qualquer conclusão sobre você. Dei todas as oportunidades para me contrariar, pra eu ouvir da tua boca e ver das tuas ações que meus pensamentos e medos não têm porquê de existir, que interpretei errado, que ainda conheço pouco de ti. Queria tanto ter estado errada. Insisti, insisti em duvidar de mim mesma, de que as coisas ruins e incômodas eram isoladas e fruto das minhas distorcidas interpretações. Ao menos fiz isso. Não te decretei. Perguntei. Perguntei antes de assumir e moldar qualquer imagem sua na minha cabeça.

Sinto que pra você, eu já era uma imagem formada, uma coisa já pronta, acabada. Previsível, conhecia, digital por digital, gostos e desgostos, desejos, sonhos e pesadelos. Hoje vejo como foi arrogante em presumir saber quem eu era. Minha pluralidade era demais pra ser lidada, acredito que era mais fácil me encaixotar, pontuar certezas, colocar margens e limites. Você escolheu as cores dos giz de ceras pra pintar a minha imagem, sem antes ao menos olhar pra mim. Não quisera olhar, ao menos me perguntasse como é para que eu tentasse te descrever tudo aquilo que carrego comigo desde que nasci. Minhas respostas não foram o suficiente. Como você queria saber mais do que eu quais eram as cores que eu carrego dentro? Foi quando comecei a arrancar a pele. Achei que vendo seria mais difícil você duvidar.

De onde veio essa desconfiança? Essa descrença nas minhas palavras? Nunca menti pra você. Nunca fui tão sincera com alguém. Mais até do que eu era comigo mesma. Consegui essa proeza pelo desespero profundo de te oferecer segurança, de querer te aquietar, de querer tua confiança.

Aprendi que não existe ninguém que possa te dar isso. É uma conquista interna se permitir confiar.

Na segunda semana, li 4 livros. Foi a maneira de preencher o silêncio do meu quarto e de calar o barulho da minha cabeça. Dormia cedo e dormia muito. Quanto menos tempo acordada melhor. Malhei todos os dias, para os hormônios do suor me limparem a tristeza. Comecei a estudar pro concurso, somente as leituras na cama não estavam sendo o suficiente. Aceitei as ligações dos meus amigos que por vezes eu estava recusando. Criei playlists gigantes pra nunca faltar música pra abafar tudo o que eu tenho medo de deixar emergir. Por fim, cortei o cabelo. Precisava ser outra de alguma forma. Aumentar ainda mais os fatos que não sabes sobre mim. Estar mais distante de você. Ser cada vez menos conhecida.

Na terceira semana, fiquei olhando o seu Instagram. Entrei no seu Spotify, escutei todas as suas novas playlists. Fique olhando as fotos da sua ex. Reli conversas nossas e tive raiva de você. Raiva de você e de mim. Como permitir que falasse assim comigo? Que me tratasse assim? Nunca fui maldosa daquele jeito. Como não vi isso? Será que me neguei a enxergar? Queria ter me abraçado as primeiras vezes que li aquelas mensagens. Lembrei quando você foi extremamente rude por uma brincadeira que fiz. Militou sobre um copo d’água, nunca fui tão julgada e categorizada por alguém. Nossa foram tantas conversas ruins! Eu querendo deixar um clima bom, puxando assunto e você com respostas curtas e perguntas fúteis. Porque eu não via isso? Você é péssimo por mensagem! Sinto muito. Não queria te magoar. Hoje não me importo em te dizer isso. Com emojis de caras tristes, parecia que queria ser ninado a todo instante, mas não tinha a maturidade, a compreensão, o autoconhecimento em se aprofundar no próprio sentimento e comunicar. E se eu o fazia, eu estava racionalizando demais, eu não estava sendo sincera sobre meu sentimento. Parece até um juiz! Ó decretador da verdade, do mundo emocional, avaliador do sentimento alheio. Eu sei que não fazes por mal. Sei lá os caminhos tortos que te fizeram a ter que e a querer aprender os sentimentos e pensamentos das pessoas antes delas mesmas. Explica, mas não justifica! Isso te tornou arrogante. Descrente. Não soube mais lidar com isso. Inflexível, intangível. Não há como prosseguir daqui. Nessa mesma semana, li um livro sobre um casal, cujo o parceiro homem era extremamente inseguro, apesar de carinhoso. Engraçado como episódios, falas e situações se repetem. Independente do cenário, dos personagens, do tempo.

Essa é a quarta semana. Durante todas elas você ainda foi o assunto de 90 por cento do tempo de cada seção minha na terapia e de cada conversa que tive com amigos. Você me bloqueou de novo. Veio dizer que anda pensando muito em mim. Eu também tenho pensando em ti! E percebi um pouco antes de começar a escrever esse texto como eu estou desde o começo desesperada pra abafar e calar esse pensamento dentro de mim. É ainda uma adaga muito afiada e me faz querer chorar. Todas essas coisas que eu tenho feito são sim conexões comigo mesma, mas de forma extrapolada e exagerada pra te silenciar aqui dentro de alguma forma. Escrever me fez e está me fazendo ser honesta comigo mesma. Hoje não conseguir cumprir meus objetivos do dia. Tudo que eu estava usando como um tampão não conseguiu conter a enxurrada acumulada. Estou enfrentando ela. Hoje a encarei. Chorei. Escrevi.

anna clarice
Enviado por anna clarice em 16/04/2024
Código do texto: T8043090
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