Cansaço
Eu vi o tempo passar
Eu vi o vento sussurrar
As brancas mãos enrugar
E o enfado que há no ar
É inútil hoje meu saber
Pois não há mais tempo a perder
O que então hei de conhecer?
Se tudo que existe me lembra o sofrer?
Há tempos não sinto suave o sabor
Das maças viçosas, dos pêssegos em flor
Há tempos não vejo da Vida a cor
Ou sinto do por do sol seu brando calor
Cansei de tanto mal sorrir
Das falsetas, das misérias, do mentir
Inúteis telas da Vida colorir
Vazio, solidão e mágoa sentir
Então, o que estou a nutrir?
Sentimentos prestes ao léu cair
Que fazer senão sumir?
Do tempo e do espaço estou a fugir
Fujo, finjo, mato, minto
Rezo, peço, corro, choro
Renego, morro, nasço, sinto
Luto, amo, sou e oro
Procuro hoje não fraquejar
E todas as guerras já não sei lutar
E mesmo sabendo da morte certa
Conservo a porta do coração aberta