Esperança vã?

Esperança vã?

Espero, espero e…

Espero o requebro da chegada

Que a solidão se vá, espero

Que o sol não fuja, intimo

Que a roupa não esteja suja

Para quando chegares, veres

Que estou perfeito

O casaco direito

E o vinco da calça estreito

Mas… espera, ainda espero

Que chegues… aguardo

Estou já cansado

Mas principalmente

O meu peito espera

Ansioso no bater atreito

Como tambor desfeito

De lágrimas escondidas

Espero, e não chegas

Foi-se o dia na noite

Espero no frio lancil

Que a promessa se cumpra

Espero de novo Abril

A irromper de tua boca

E gloriosa a presença

Sempre pouca e louca

Aquelas palavras

Que me inundaste

Que fizeste?

Sumiram-se nas trevas

Apenas ficaram as guerras

Comezinhas… de bastidor

Anunciavas quase o amor

E a fraternidade geral

A esperança da igualdade

Acabar com a fome, a sujeição

Tudo seria diferente afinal

E rebateria mais forte cada coração

Irmanado na população sem se olhar

A condição de quem fala, trabalha

Festeja, ama ou sente e apenas

É povo que reaprendeu a amar

A viver plenamente sem melancolia...

E não a odiar…

Que esse era o legado que existia

E devia acabar

Das trevas nascer a luz do novo dia

Mas não acabou

Continuou

E assim, eu… continuo à espera

E espero indignadamente

Que venhas… Já!

Ordeno-te que acordes

E sejas irmã de todos

Ricos e pobres

E não a esperança vã

Que atroou os meus ouvidos

Naquela fresca manhã

E ainda atordoa os sentidos

Dos que ingloriamente

Acreditaram e

Por ti deram a alma

O corpo e a palavra!

Então?

Será que tudo, não vale nada?

Toda a dor e julgamento

Cada flor murcha no tempo

Cada emoção manifestada

E as solas gastas ao vento

E à chuva na longa estrada?!

…. Bah……

Parece que não…

Minha calça está gasta

Sofreu já enorme rasgão

A camisa desbotou

E tem falta de botão

Meu cabelo esbranquiçou

E meu rosto enrugou

…. Mas o coração não!

Está mais curto o pavio

Mas meu pobre círio

Jaz ainda aceso no lancil

Esperando a revolução

Que me prometeu Abril

E ela virá, creiam ou não!

Posso enregelar e enrugar

Posso virar múmia de gaze

Mas o que sente a alma

Coadjuvado pelo coração

Será sempre a tua esperança

De que "toda a mesa terá pão"

E "toda a criança será meu irmão"

Assim espero…

Assim será!

Queiram….

Ou não…

Ela virá!

Espero!

Abatido, mas espero-te.

© Luís Monteiro da Cunha