O canto do espanto

Eu, por não ver nada, muito ouço

E ouço maravilhosamente bem.

Há sempre um cochichar daqui,

Um sussurrar dali, sempre meio sonso,

Manhoso e manso.

Eles vêm de todos os becos, esquinas e cantos.

Têm a cor da crueldade e da mentira,

Como vêm de bocas brancas preconceituosas,

Aliás, até de bocas negras traiçoeiras;

Bocas.Trazem um hálito disfarçado

Com a droga da falsidade e provocam,

Enganosamente, um cheiro bom.

Mas é podre, podre até os confins da alma.

Faz escorrer um visco demoníaco, lodoso,

Visguento, asqueroso, nojento

De cada som emitido.

Em uma oficina imunda trabalham

Diuturnamente, produzindo palavras

Para a construção da miséria humana.

Em sua falsidade dizem:

“Batemos nos cachorros por amor a eles”.

Em nome da lei cega, faca amolada

Contra os simples e indefesos.

Malditos sejam os que cochicham pelos cantos,

Que lambam os escarros dos cães sarnentos.

Eu, da minha parte engulo o meu grito em protesto.

Vou abrir mais ainda os ouvidos

E vomitar de volta essas misérias

Com a rouquidão, com o cheiro

E com a cor do meu ensurdecedor silêncio.

carlinhos matogrosso
Enviado por carlinhos matogrosso em 05/02/2013
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