Instante

Instante

Regina Romeiro

E nesse instante, nesse exato instante um instantâneo lance

Arremeda-me o instante de exatidão, de compreensão

Se de razão ou loucura?

O que sei é de solidão, vastidão de solidão

E me preencho de desprazer e aborrecimentos da ladainha

Da mesma missa do mesmo galo que canta e nada espanta do meu coração

Do cão a latir na noite, lobo uivado bruxuleante

Amante sou de quem? A olhar a lua simplesmente

Amante do nada que se tateie, do monstro na noite que engana

Taças de sangrias a percorrer, pedras de gelo que ruborizam e aquecem o corpo

Torpor, etílico torpor das noites, lua do solitário insistente

Abandonadas noites de uivos íntimos, religião dos isolados

Nesse exato instante grito, chamo, reclamo, rezo que não seja tarde

Meu catecismo de único amor, de dor e dor está surrado por repetições

E me olho por dentro e procuro os restos do entusiasmo, da vaidade, da sensualidade, Nesse exato instante sinto-me na correnteza me afogando

Esqueci de nadar e desaprendi, esqueci do prazer carnal e me dividi solitariamente

Apartei-me, me isolei

Mas não morri ainda, coloco as mãos nos ouvidos para não ouvir a ladainha

Não ouvir o mesmo galo, o mesmo cão, para não ser atacada pelo lobo que uiva

Sorvo a sangria e estanco a correnteza, corrente que prende sem alianças

Rasgo do peito a fantasia no instante. Razão ou loucura?

Apenas procura de novas luas, de um nascer do sol

Fuga da ladainha de sempre, de dor e dor. Instante estanque