Poentes e Auroras

Eu sou noite

e ele, dia.

Ele, luz cegante, refulgente,

não sabe, não entende

o grito emudecido

de uma lua eclipsada.

E eu já me sinto tão cansada

de ser noite e de ser nada

e de tanto não me ser...

desse encontro permanente,

sem me saber...

Ó Deus,

suspende os poentes

e as auroras!

Dá-me um tempo

pra costurar os véus

dessa noite esfarrapada,

em que as estrelas

já não sabem mais que brilham

e já nem conseguem crer

que são sóis e que são belas.

Suspende, ó Deus,

os poentes

e as auroras!

E dá-me espaço

entre as feridas que gangrenam

e não sentem mais que doem,

e já não sabem acreditar

que existe cura.

Suspende os poentes

e as auroras!

Ó Deus,

dá-me um tempo de silêncio

e um espaço a contemplar.

Mas se não podes cessar

o movimento da esfera

e se as estrelas são sonhos

irreais, inalcançáveis,

cega-me os olhos!

Anestesia-me a alma!

pra que eu não veja

a imensidão deste universo

e não sinta a dor de estar assim

limitada

a este espaço, a este tempo,

a esta órbita,

sem saber se é assim mesmo

e se é só isto... mais nada