QUEIXA

De que vale me endeusares

Se fores incapaz de compreender os meus conflitos?

De que vale desejares o meu corpo

Se as nossas almas não estão conectadas?

Navegas em um oceano cujas águas

Eu não tenho o direito de me banhar.

De que vale dizer que me amas

Se me dás a solidão como companhia

Nas noites em que as corujas crocitam

Agourando a morte de entes queridos?

De que vale erigir altares

Se já não há oferta para o sacrifício?

Em alguma esquina, na areia da praia, em uma rua,

Uma praça, um cinema qualquer,

Deixamos cair um pedaço de nós.

E os coveiros de plantão o sepultaram

Por isso, muitas vezes, divagamos como zumbis

E acordamos como dois desconhecidos.

Entre os troncos abandonados de uma mata

E banhados pela luz da lua solitária ousamos

Desafiar os deuses e plantar uma árvore.

Hoje contemplamos seus galhos desfolhados,

Seus frutos jazem distantes levados pelos pássaros

Que se alimentam de sonhos.

De que vale entoar uma canção

Se insistires em ouvir apenas o canto das sereias?

No teu desvario confundes as estrelas com os planetas

E fazes do nosso leito uma lápide tumular.

03/05/2019

henrique ponttopidan
Enviado por henrique ponttopidan em 03/05/2019
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