FECUNDAÇÃO

Chove.

A tarde molhada parece triste

e a noite

chegando mais cedo

inunda tudo em profunda melancolia...

Não há,

como nas tardes de sol,

o canto crepuscular das aves,

ora abrigadas em seus ninhos.

Sonho

e a melancolia da tarde

inunda também a minha alma,

que treme de frio.

Pela vidraça da janela

aprecio a coreografia suicida

do efêmero bailado

das frágeis gotas da chuva..

Entrego-me inteiramente ao devaneio

e, num instante, sou também gotas de chuva..

Sou milhares de gotas caindo

formando um rio

que desce o pequeno vale

sem destino traçado.

Agora, como rio, sou correnteza forte.

Riacho inundando o vale para a fecundação

e todas as sementes

dos antigos sonhos adormecidos

germinam e tornam-se vivas...

Continuo sonhando.

Sou gotas de chuva.

Sou riacho cumprindo um destino

e não estou mais melancólico,

pois o vale fecundado

revive com a minha passagem.

E, mesmo que toda essa vida

seja apenas um sonho em uma tarde chuvosa,

só por isso vale a pena...