Onze de Maio
Estava comigo até ontem
Companheiro de muitas horas.
Morreu.
Antes que me matasse, é claro
Mas já sinto sua falta.
Foi tarde,
Melhor se tivesse sido outrora.
Pareço cuspir no prato que comi
Mas não é verdade.
Lamento não ter sido forte
Forte como na minha adolescência.
Apesar da minha pouca experiência
Não me permiti experimentar
Por mais que fosse moda
E todos a minha volta
Seduziam ao fumar.
Foi depois de me tornar pseudo adulto
Passados vinte anos da minha vida
Que me deu essa vontade de tragar.
O trago da cachaça não bastava.
Fumei um…dois…dez numa noite.
E a ressaca?!
Não gosto nem de me lembrar.
Passou um…dois…três meses sem que tragasse.
Comprei um free…tentei fumar não consegui.
Deixei pra outro se matar.
Veio o trago da cachaça
Aquela que meio que sem graça
Foi tirando da minha veia
Toda aquela traça
Contida na desgraça
Que um dia fui fumar.
Não teve jeito:
Me peguei embriagado
Meu corpo pedindo o danado
E eu maltratando meu peito.
Mas era bom...
Companheiro de todas as horas..
Do acordar ao não dormir a noite.
Não me desfaço dele.
Me tirou o que eu não tive: pai
Mas me deu outras
Tantas outras coisas:
Amizades, ideias, tranquilidade
Calmaria, conversas, musicalidade
Boteco, sinuca, sensualidade…
Pode até dizer que sem ele teria o mesmo
Concordo.
Só não garanto que seria da qualidade inquestionável,
Irredutível e avassaladora que tive e tenho.
Foi através dele que olhares se trocaram
E pouco tempo depois meu rumo nasceu.
Dirão que teria acontecido de qualquer forma
Que mais cedo ou mais tarde ele viria.
Pois garanto que não…
Nunca se eu não fumasse.
Esse elo se perdeu, é bem verdade
Foi melhor assim
Mas meu herdeiro
Esse sim é sábio
Aos cinco me perguntou:
Se fumar não serve pra nada, pra que o senhor fuma?
Não sabia onde me enfiar…
Achando que fosse tranquiliza-lo gritei
Vou parar!
E algo inimaginável ocorreu:
Quando?!
E sem querer decepcioná-lo
Disse no seu aniversário
Pode me cobrar.
Um presente
Mais pra mim do que pra ele
Onde outros onzes de maios
Poderei desfrutar do seu sorriso
Do seu beijo
Da sua alegria aquela que me foi tomada,
Mas que não permitirei que tirem dele.
Obrigado meu companheiro cigarro.
Vou te guardar na lembrança
E também na esperança
De nunca ao meu filho faltar.