Será este o poema que eu caço?

Se o poema não nasce

ou surge meio torcido,

quem pranteia sou eu.

A dor dilacera o tecido

e no peito meu a carne

a mercê da dor, adoece.

Se o poema não corre solto

e leve nas linhas do papel,

perco o chão e o meu céu.

Fico, assim, sem sal e mel.

Aturdido, um tanto revolto,

vida torta, um porto morto.

Busco o poema arrebatador

que na primeira mão-de-cal

aparece virgem e magistral.

Uma diva, em noite nupcial,

a deleitar-se em puro amor,

louca, sem nada de divinal.

É este o poema que eu caço,

armo laço, arregaço o peito,

e ele teima em não nascer.

Quanto mais faço e desfaço

mais me perco no fracasso

de não vê-lo resplandecer.

Se o poema não corre solto

e leve nas linhas do papel,

perco o chão e o meu céu...