O medo que já me fez um prisioneiro
Eu gostava de sonhar
Meu peito era curioso
Havia desejo em desbravar
Sentia o viver misterioso
E então eu me acovardei
Fui amedrontado pelo falhar
E então eu me assombrei
Com os vislumbres do errar
Eu que já quis escalar montanhas
Que já quis tocar as estrelas tão brilhantes
Ouvi o desespero, e caí em suas artimanhas
Olhei pros meus sonhos, e eles estavam distantes
E eu que já fui tão ousado
Que já me entreguei tantas vezes ao destino
Senti meu corpo travado
Enquanto se esvaía minha coragem de menino
Eu que sonhei com universos
Me acomodei com o toque do conforto
Deixei meus quereres serem dispersos
Deixei meu eu idealista ser morto
Eu me conformei com o pouco
Aterrorizado pela sombra do passado
Preferia respirar em sufoco
Do que voltar a sentir o ar esgotado
Então...
Me fiz o mensageiro, e o ser profetizado
Me fiz o mortal, e o herói retratado
Me fiz o bardo, e o escritor da poesia
Me fiz o oráculo, e o criador dessa profecia
Quando as migalhas deixarem de ser seus grilhões
Quando o pouco, de refém, não mais lhe fizer
Terá as mãos vazias, mas sonhará imensidões
Terá consigo o nada, mas lutará pelo que quiser
No meu tropeçar destino em pedra de vazio
A pancada do acaso soltou o meu sorrir
Não repetimos erros, ninguém se afoga no mesmo rio
A água nunca é a mesma, e como a vida, faz seu seguir
Tirei a venda de remorsos, e meu olhar pôde abrir
Me vi deitado em restos, sonhando com migalhas
Me vi acovardado, temendo meu existir
Me vi Juiz e réu, sentenciando minhas falhas
Então vi que havia dor em meus passos
Então vi que havia fome em minha alma de criança
Então eu devorei o medo, e todos meus fracassos
Aceitei o prato amargo, e fui saciado de esperança
Me foi preciso tudo isso…
Sentir o arder do joelho ralado
Ruir a falsa crença do guerreiro
Deixar o orgulho me ser tomado
Aceitar o fardo de ser o meu coveiro
Me foi preciso tudo isso…
Para meu sonhar ser libertado
Para eu ousar sair do cativeiro
Para eu enterrar nas profundezas do passado
Esse medo que já me fez um prisioneiro