De onde veio nossa primeira raiz?

Num canto tão esquecido do mundo
Longe de qualquer progresso
Escondido e protegido
Pela imponência de muitas serras
Uma família certo dia chegou
E ali, resolveu fazer morada
Em meio a tantas dificuldades
Até mesmo a falta d,água
Não se sabe de fato
Como isso aconteceu...
O primeiro a chegar naquelas terras
Na história se perdeu...
E as pistas não são concretas
Mas a comunidade foi real
Permaneceu e cresceu lá entocada
Por muito mais de um século
E vi o meu avó, morrer aos 80 anos
Envolvido pela paz daquelas serras
Percebe-se a partir daqui
Que estou a falar das minhas raízes
Pois é, estou mesmo!
Desde criança tenho a curiosidade
De saber como chegamos naquele lugar
E não encontro respostas que me saciem
Por isso quero registrar minhas suposições
Fios que por ter nascido naquela cultura
Com eles lidei e aprendi a tecê - los
Veja bem! Naquela brenha de serra
Muito distante e isolada
Das outras sociedades
Uma família denominada Batalha
Viveu singelamente
De acordo com suas próprias
Potencialidades...
A cidade de São Miguel
Que é a sede do município
Do qual, antes pertencia
O Sítio Serra das Almas
Lugar onde ficava a nossa comunidade
Foi colonizada por portugueses
Mas nada dessa cultura chegou até nós
E alí,nossa família...a família Batalha
Minha família paterna, permaneceu isolada
Perdida ou escondida... 
Naquele mar de serras
Até, que pouco a pouco, seus membros
Por não suportarem tantas dificuldades
Foram abandonando aquelas terras
E aquele povo com jeito de índio
Que tinha suas próprias terras divididas em família
Que produzia seu sustento em regime de mutirão
Que vivendo do cultivo pra subsistência
Só plantava em época de chuvas
E cultivava naquelas alturas
Milho, feijão, mandioca, fava e algodão
Que só consumia o que dali retirava
Que em maioria casava entre parentes
Foi aos poucos sendo vencido
Pelas dores da ausência das políticas públicas
E se vendo menosprezada e discriminado
Frente ao progresso do município sede
A comunidade se desfez em ritmo acelerado
E da sua história poucos fragmentos restaram
Estando hoje apenas na oralidade deste povo
Suscetível a em breve desaparecer por completo
Preocupada com a origem das minhas raízes
Venho tentando a vários anos
Encontrar respostas para minhas inquietações
De onde viemos?
E por que escolhemos aquele lugar para morarmos?
Em anos de profundas reflexões...
E sem nenhuma base científica
Mas orientada pelo norte perseguido
Que pela minha vida percorri
Acredito que nossa comunidade
Poderá ter se formado
A partir de um pequeno quilombo de índios
Que por um determinado tempo
Se escondeu para sobreviver da cruel escravidão
E quando minha geração chegou
Já estávamos misturados a outros povos
Mas ainda, tendo muito dos costumes indígenas
Como também a maioria das características físicas
Pois temos corpo, cor, cabelo e cara
Que retrata e nos faz lembrar esse povo
Um perfil do qual sinto orgulho
E quando me olho no espelho
Vejo em mim, muitos traços
Que me fazem reconstruir em reflexões
Nosso início desconhecido
Mas ainda desejado e buscado
Nas palavras que foram silenciadas
E talvez enterradas vivas
Antes mesmo, de ecoarem na voz do vento
A corrente comunitária de minhas raízes
Foi quebrada por não ter sido cuidada e preservada
E hoje, procuro encontrar pequenos fragmentos
Para que possamos reconstruir mesmo colada
Por pequenos pedaços poucos e frágeis
A história da nossa história
Uma busca por cada raiz da família Batalha
Que chegou e viveu nas entranhas da mata serrana
Nesse lugar de nome Serra das Almas
Lá no Alto Oeste daqui do RN
Onde hoje só encontramos
Poucas ruínas das nossas moradias
Ou somente
Alguns pés de cajarana e seriguela
Que pontuavam a existência de cada casa
E eram lugares preferidos
Por crianças e animais
Um mundo de um povo simples e unido
Que não pode continuar organizado
Em comunidade familiar
E se desfez antes de se conhecer
Um povo que nunca soube
De fato quem foi...
Nem tão pouco com isso se preocupou
Mas eu sim!
Quero saber nossas verdades...
Quem fomos? E quem somos?
Porque amo muito... Esse meu povo.
***
Fátima Alves - Poetisa da Caatinga
Natal,11.09.09
Texto publicado no meu livro "Retratos Sentimentais da Vida na Caatinga"
Edição do autor - 2010
Foto de Emanoel Milhomens






 
Maria de Fátima Alves de Carvalho
Enviado por Maria de Fátima Alves de Carvalho em 12/09/2009
Reeditado em 24/02/2017
Código do texto: T1805518
Classificação de conteúdo: seguro
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