Rostos têm muito a dizer (a respeito do Big Brother)

Rostos: que aparecem, que parecem...

Que desaparecem, que emudecem..

Refletindo sobre o 'Big Brother' e o processo de eliminação do princípio ético da alteridade promovida pela aldeia global.

Os rostos têm muito a dizer!

Muitas vezes a dissimular o sofrimento,

Ou a esconder a dor

Outras tantas a espantar o tormento

Ou tímidos a manifestar o rubor

Os muitos rostos que vi ao longo da vida

Sempre me marcaram a caminhada

Todavia nem sempre os pude alcançar

Ou o seu significado decifrar!

O que me encanta é a sua expressão

De conjugar tantos sentidos

De modificar ante aos desafios

Ou se bloquear ante os temores...

Rostos, de uma gente oprimida

Com uma expressão vaga de procura

No olhar distante da cena que tortura

Ante a violência que maltrata e aniquila.

Há todavia outros rostos

Produzidos, maquiados, disfarçados

Travestidos de heróis, gladiadores modernos

Na grande aldeia dos Big Brothers

Enquanto anônimos rostos não medem limites e esforços

Em suas ações por reduzir os grandes dramas humanos

Uma emissora concessionária estimula a quebra da privacidade

Com cenas bizarras, aviltantes e vulgarizadoras do amor e da liberdade

O que a mídia passa a tantos rostos marcados pelo sofrimento?

Enquanto o tão sonhado milhão do ‘Herói´ do Bial

Atravessa em uma saga novelesca tão ao gosto da Globo

Se estimula o espírito perverso de eliminação do outro, que coisa mais Neanderthal?

Outro dia acompanhava uma discussão de jovens alienados

Que marcavam encontro para acompanhar passo a passo

Toda a engendrada estocada de vulgarização das cenas

Transmitidas em canais a cabo 24 horas.

As edições de programas como o tal ´Big Brother´ do Bial

Afrontam valores já tão distantes do nosso cotidiano

Como a ética, moral e os bons costumes, disseminando

A venda de uma lógica nada diferente do Baú do concorrente Abravanel.

Assim, são para mim, sem expressão,

Os rostos opacos de tanta gente que dissimula

Ante o sofrimento de tanta outra gente esquecida

Que consomem horas no divã de amargura, por pouca feitura.

Rostos esses que mergulham na busca da fama fácil

Da projeção sem trabalho e sem esforço, modernos narcisos

Ainda se divertindo na maior armação, inútil e fútil

Vazia e sem conteúdos, a Globo merece um prêmio por transformar sua obediente e cativa platéia em idiotas modernos.

Afinal, consegue extorquir em telefonema, e-mail e torpedo

O duro quinhão com o suor de cada dia conquistado

De inúmeras famílias, muitas delas ligadas ao padrão global ditado

Pelo ´único´ prazer de ver alguém no muro, eliminado.

Esta é a lógica disseminada da eliminação

Da perda do significado da alteridade

Da necessidade da existência do ´outro´, da solidariedade

Da cruel escola global da violência

que não começa nas ruas,

mas captadas nas antenas,

em nossos próprios lares a cada encenação...

Ah, se todos esses rostos anônimos

Atores reais tomassem da vida o seu palco, inda que seja utopia

E rasgassem as máscaras desses vendedores de ilusões,

E argutos promotores de vilões.

Ah, se da laranja mecânica emergissem

Um novo sentido de liberdade que não seja esta da libertinagem

Do consumo imoral, de mentiras pregadas como verdade,

Talvez a sociedade possa ainda

se libertar das correntes do monopólio desta total e despudorada sacanagem.

Rostos anônimos ainda,

também têm olhares desconfiados

Ouvidos perfilados

Gestos comedidos

Mas o conjunto das expressões

já demonstra o quanto estão perturbados,

Em contraste com o vazio das vidas

Dos ´heróis do Bial´ no chulo picadeiro global

Estes rostos têm história, idas e vindas

A eles sim reverencio como meus heróis, e não são fabricados, objeto de desejo, sedução ou de mercado, é o ser humano total...

AjAraújo, escrito em Março de 2007.

Por que não iniciamos um movimento em nossas entidades, representantes políticos (muitos de questionável representatividade, tá certo), meios jurídicos para responder contra tamanha insanidade? Isto não é mais liberdade de produção, de imprensa, isto é invasão de privacidade e produção em série de personalidades distorcidas, sectárias e violentas. Será este o espírito "global" de nossos tempos?