Amor Incondicional

As mãos cuidadosamente remexem a comida.

Aquelas mãos, cujos sulcos se evidenciam numa pele já sofrida pelo tempo,

preparam mais uma fonte de vida.

Mexendo o angu com certa dificuldade, uma vez

que a dor insiste em imobilizar seus membros, ela se lembra da dor.

Daquela dor que veio repentinamente e cessou

com o nascimento de sua segunda vida.

Lembrou-se com carinho do rostinho feliz daquele anjo,

cujo olhar dizia “oi, mamãe, aqui estou eu”.

Lembrou-se das dificuldades da vida; do crescimento sadio daquele anjo.

A pá de angu, alheia àqueles pensamentos,

gira feito marionete, num ritmo gostoso e silencioso

que produzem na mãe uma paz de espírito e uma certeza do dever cumprido.

O angu, o arroz e o feijão, já prontos,

repousam fumegantes sobre o fogão à lenha.

Ela, à espera do filho, cuidadosamente fecha as panelas,

como se fossem metais preciosos, protegendo-as das impurezas.

A enxada lavra aquela terra.

O ritmo daquela lida produz dores em seus braços.

A fadiga, que toma-lhe o corpo também, fá-lo pensar.

Seus pensamentos vagam à sua infância.

A enxada, também alheia àqueles pensamentos,

movimenta-se freneticamente na terra fértil,

produzindo sons que acalentam o anjo,

proporcionando-lhe uma paz de espírito e a certeza do infinito amor materno.

Ele, ansioso em reencontrar a mãe, prepara e semeia a terra,

depositando sobre ela o frescor da água

que escorre abundantemente por aquela terra santa.

“Bença, mãe!”

“Deus abençoe, meu anjo! O almoço tá pronto.”

Marcos Botelho
Enviado por Marcos Botelho em 14/05/2023
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