A Balada do Corno

Melhor ser corno do que não ser nada,

Que não pilhar um dia em sua cama,

Aquela mulher, a quem tanto se ama,

Nos braços do rival, toda enlevada.

E nesta cena, horrenda de se ver,

A mais dolorosa constatação

É que é nos braços do tal maguarão

Que ela sente duas vezes mais prazer.

Da galhada amiga brota a consciência

Que falíveis somos nós nesta vida,

Vem nos lembrar a narcisa ferida

E tripudiar com a nossa impotência.

Portanto, amigo, não tenhas receio.

Encara tudo isso de mui bom grado,

Pois, mesmo o boi, o gamo, o alce ou o veado

São seres respeitados em seu meio.

Ouve o bom conselho, não chora, aceita.

Por mais que a fisgada a fronte te doa,

Recebe este ornato como u’a coroa

Que te enobrece a alma e a cabeça enfeita.

E, assim, como um rei clemente, agradece

Àquele que, com maior engenho e arte,

Tomou teu posto, fez a tua parte.

Que outro leal amigo acharás como esse?

Tua mulher? Aquela santa? Perdoa!

Que culpa terá ela se a natureza

Deu ao moço tamanho pé de mesa,

E a ti legou esta coisinha à toa?

Então, amigo, orgulha-te do adorno,

Que bem mereces. E, se ouvires troça,

Ignora, não liga, faz vista grossa.

Vive feliz tua condição de corno!

Rio, 2007

Antonio Sciamarelli
Enviado por Antonio Sciamarelli em 26/03/2007
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