O dia em que a terra parou

Eu nunca mais esqueci

No dia em que a terra parou

Tantas coisas aconteceram

Que até santo duvidou

Foi um verdadeiro chafurdo

Que o tempo mudou

E para você que ainda não sabe

Vou lhe contar o que se passou

O bode tomou banho

Caiu na chuva

E o macaco, danado

Trocou banana por uva

O porco não quis lama

O sapo finalmente andou

A vaca cuspiu

E a galinha mijou

O vampiro bebeu água benta

E viajou durante o dia

O gato e o cachorro se abraçaram

Coisa que não acontecia

A girafa foi a feira

A preguiça trabalhou

O jumento tirou férias

E até viajou

O elefante falou

Até deu pra se danar

Pediu a mão da cobra

Pra com ela se casar

O tatu e o veado brigaram

A onça saiu pela rua

O saci encontrou a outra perna

Que estava lá na lua

Foram tantas coisas incríveis

Que não dava pra acreditar

As bestas se abestavam

E os teimosos começavam a teimar

Foi um dia pra casseta

Que deu o que falar

E pra matar sua curiosidade

Mas algumas vou contar

O chão tremeu

O ladrão não sabia roubar

O político não prometeu

Mas começou a rezar

O diabo beijou a cruz

Banhada de água benta

O mar secou

A formiga comeu pimenta

As crianças não quiseram brincar

A barata foi à praia

E o padre no embalo

Danou-se na gandaia

O céu ficou verde

O mentiroso não mentiu

As casas todas caíram

A Europa ficou no Brasil

O mágico não fez mágica

Mesmo assim o cego viu

O mudo falou

E foi o que o surdo ouviu

O rico fez caridade

O pobre rasgou dinheiro

Homens e mulheres não se queriam

Era guerra o tempo inteiro

Isso ainda não é tudo

Mas destroços se deu

Quem não aguentou o tranco

Com certeza de susto morreu

O mundo virou pelo avesso

E depois escureceu

Saibam vocês agora

O que ainda aconteceu

O bandido fez o bem

O professor não sabia de nada

O sol não apareceu

A lua foi quebrada

O vendedor não vendeu

Pois não tinha quem comprar

O doido amarrou-se todo

Para o vento não lhe carregar

O medroso criou coragem

O valentão correu

Depois de uma mordida danada

Que um banguelo lhe deu

O corno tapou os olhos

Com as cuecas do Ricardão

O pastor desfilou sem roupas

Na praça de arma na mão

A polícia não prendeu ninguém

O médico não consultou

Os automóveis não se moviam

Porque o combustível acabou

O papudim não quis cachaça

Pois não tinha onde ele abusar

Um aleijado das pernas saiu correndo

Com medo de uma tartaruga lhe pegar

Tudo isso aconteceu

Não sou de mentir e enganar

Tenho papéis e escritas

E com isso posso provar

Se você não acredita em mim

É só perguntar

Ao finado Neco do caneco

Que também estava lá