SURDEZ

_ Bom dia comadre.

_ Quer que o cão ladre?

_ Como tem passado?

_ Já está acordado. Nem sequer dormiu.

_ Já alguma vez viu?

_ Tem vida vadia.

_ O raio da tia? Fez-se bem vaidosa.

_ Partiu-me um rosa. Andava a correr.

_ Nem a quero ver. Eu não gosto dela.

_ Era amarela. Cheirava tão bem.

_ Tudo lhe convém. Só prega mentiras.

_ E as gatas, que giras. Já comem de tudo.

_ Pois, pois, é só no Entrudo.

_ Não é isso.

_ É enguiço?

_ Fazem comichão.

_ O tal ladrão? Já se foi embora.

_ É mesmo agora. Vou já chamar o pai.

_ Ai, ai, ai, ai. Qual pai, qual quê?

_ Ah! Logo na TV? A tal novela.

_ O cão caiu na esparrela?

_ Pois ia a atravessar a viela. Chegou a morrer?

_ Nunca chego a ver. Não gosto de caprichos.

_ E os outros bichos? Que lhe aconteceu?

_ O cão me mordeu. Foi cá uma dentada.

_ Que velha malcriada. A tal tia.

_ Tanta alegria. Que lindo romance.

_ Quer que ela dance? – Já pouco se mexe.

_ Vamos comer, senão o caldo arrefece.

_ De tudo se esquece.

_ Está boa a sopinha?

_ Anda doentinha.

_ Bebe um copinho?

_ O seu maridinho? Já morreu há anos.

_ Só um não faz danos. Olhe, está de chuva!

_ Pobre viúva! Lá vai vivendo.

_ Está escurecendo. Vou voltar pra casa.

_ O Rui é uma brasa!

_ Até amanhã.

_ Tem uma bonita irmã.

_ Adeus, ó vizinha!

_ Sempre a sorrir.

_ Vá mas é dormir!

_ Devem estar loucos.

_ Raios partam os moucos

O Poeta Alentejano
Enviado por O Poeta Alentejano em 24/02/2008
Código do texto: T874084
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