SANIDADE

Mentira! Tudo o que disse até hoje é mentira!

Menti ao dizer que gosto de ti, menti mesmo.

Menti em tudo que te disse, verdade, verdade.

Menti até no que não te disse, menti, menti.

Não falei a verdade em momento algum na vida.

Nem quando fui mais sincero comigo mesmo.

Aliás, nunca fui sincero comigo, nem mesmo.

Por que seria, então, sincero contigo hoje?

Só porque hoje estou mentindo a verdade?

Não vou mais continuar mentindo pra mim.

Para ti, quem sabe? Talvez eu continue, ué.

Não vou mais parar de falar a mentira

Mais verdadeira que existe em todo meu ser.

Não que seja meu ser algo que não é.

Ou que não seja algo que é, pois é.

Só que não sou aquele ser cheio de verdade.

Também não sou aquele cheio de mentira.

Quero, ao contrário, ser aquilo que não sou.

Não ser o que sou é demais para mim.

Tá certo que o que não sou nada é,

Mas é algo mais do que quero ser.

Só quero o que me for intimamente devido

Já que o que me é devidamente íntimo não tenho.

Viver? Ah, viver! Quem precisa? Quem?

Também não é preciso queimar os navios.

E se quisermos sair dessa ilha que somos nós?

Não que tal ilha seja inabitada e solitária,

Nós é que somos. E nada somos, sequer temos.

Ora, se não se é, não se tem. Ou tem?

Hoje digo que não te tenho. E é verdade,

Não é mentira, juro. Quando falo a verdade não minto.

E digo também que não te quero mais. E é mentira.

Também estou sendo sincero. Pois assumo que estou mentindo.

Só não sei mais se ainda existo, não sei.

Sei que estou aqui. Onde? Não sei também.

Onde é o agora? Quando é o aqui? Hein?

Só a loucura faz sentido em minha vida.

Acreditas?

Ilhéus/BA, 25 de abril de 2010.

Ao louco que há em mim.