Eu existia

No princípio, eu estava lá.

Falava outra língua. Aliás, não precisava falar. Eu era entendido sem precisar falar.

Não precisava ser amado nem está feliz. Eu era amado e feliz. Nem precisava saber o que seria ser amado ou feliz – só era.

Existia – Só isso importava.

Estava nu. Não sabia. Eu não precisava saber. Só existir era importante.

Vivia.

Eu não precisava saber. Só viver.

Eu voava. Eu existia. Bastava existir.

Eu estava lá e era infinito. Um silêncio bom. Eu voava.

Eu não precisava saber nada. Nem que eu existia. Só existir era suficiente.

Foi quando me pegaram. Houve uma luz.

Durante um tempo ainda fiquei comigo mesmo. Apegado aquela não existência gostosa.

Com o tempo começaram colocar coisas em mim.

Aprendi uma língua estranha. Mostram-me outros que também foram ensinados a falar a mesma língua.

Aprendi coisas – disseram que seria importante.

Já não conseguia viver sem entender ou explicar.

Aprendi sobre amor e felicidade. Eu precisava ser amado e está feliz. Sabia os conceitos e aprendi mais: o oposto.

Sabia mais: isso. Aquilo.

Vesti-me. Sabia o que eram roupas – eu precisava saber. Eles disseram.

Já não voava. Tudo pesava. A existência pesava.

Eles disseram que eu seria feliz me distraindo com o que eles me ensinaram. Eu tenho coisas. Sei os nomes das coisas. Não posso saber mais do que os nomes que eles me ensinaram. Eu não seria feliz - disseram eles.

Só saber os nomes e tê-las é o suficiente para que eu não me lembre de mim mesmo.

À noite é que eu me visito. E choro pedindo que eu me ache. Logo me distraiu tendo coisas, fazendo coisas. Eles me ensinaram a fazer coisas e eu não consigo discordar do que eles me ensinaram.

Onde me acharam foi onde me perdi.