Temores

TEMORES

(As faces do RESODEMO)

Tudo começa

Com um momento

De paz, sossego, RECOLHIMENTO,

Que de tanto se procura

Como um remédio, como uma cura

Eis que dura.

Fica ainda mais e mais, nem se atina

Quando se vê, já não se vai

Vira rotina.

Ele como irmão mais velho, ancião,

O anfitrião

Abre suas portas

Para as outras que virão.

( )

Muitos já haviam me alertado

Cuidado com a velha senhora, a SOLIDÃO.

Ela mora ao lado,

Não manda recado,

Já vem com permissão.

Por isso, sem demora

Chega antes, de antemão.

Ardilosa que é, sorrateira

Aboleta-se no meu corpo: roceira.

Encrava-se na pele,

Escava a derme,

Epiderme,

Epidemia,

Angústia,

Agonia.

Os ossos, arranha,

Tece sua teia

Como aranha.

Derrama seu veneno,

Na veia:

Última ceia.

Penetra no veio mais profundo,

Arrancando o que de mim é mais fecundo.

No bombardeio do solo antes fértil

Tiro de bazuca, canhão

Lancinante é o projétil

Que estraçalha o corpo, o coração.

Fúria indomável, me arrasa,

Fico tíbio, fico débil

Prostrado, sou estéril,

Tábula rasa.

De visitante, vira hóspede

E depois, proprietária

Besta fera, alimária.

Ressurge mais forte com o sol,

Mas na lua também é desenvolta

Vai e vem, vai e volta.

Moto-contínuo,

Moto-perpétuo

Bem distante, bem de perto.

Das constelações, da estrela-anã,

De hoje, de ontem, de outrora,

Cavalga pela aurora,

Galopa no amanhã.

Me derruba, debilita

Dor supina,

Luta aflita,

Me domina.

Da vitória,

Do despojo

Lá no fundo

Lá do bojo

Da poesia, rouba o verso, rouba a rima.

Cala-me a voz,

O silêncio em mim atua

Implacável algoz

A vida, deixa-me nua.

Diante da sofreguidão,

A velha senhora chama

Sem rodeio, sem desvão

Da funesta plaga

A próxima praga:

Sua filha, a DEPRESSÃO.

( )

Quando não resta mais o que fazer

Único verbo que se conjuga é o sofrer

Passa o tempo,

Tudo é lamento.

Passa a vida,

Tudo é ferida.

Futuro, presente, passado.

Não importa mais, tudo está queimado.

Resta apenas o rescaldo.

Sonhando vou partindo

Com os amores vãos

E com as dores que vão ...

Surgindo.

Quero um outro mundo:

Nem acústico, nem estéreo

Apenas, etéreo.

Finalmente nos estertores

Saem de cena os cruéis atores

Eis que surge

Ela, prima dona

Canta,

Um canto lúgubre,

Guia

Um carro fúnebre.

Nesta hora,

Minutos finais,

Instantes fatais,

Não importa mais o agora.

Só se vê uma direção, um norte

Por azar ou pura sorte

Vou-me embora

Com a MORTE.

© Leonardo do Eirado Silva Gonçalves

15 de novembro de 2017

Leonardo do Eirado
Enviado por Leonardo do Eirado em 27/05/2018
Código do texto: T6347635
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