Manoel

Manoel era travesso

Vivia de engolir palavras

Para encher a barriga da poesia, dizia

Gostava de tapar o sol com peneira

Só para sentir o gosto do impossível

Com cabeça nos ombros da lua

Contava histórias como contava estrelas

tricotando sem pressa as constelações.

O jardim era sua televisão

Via aranha embalando marmita

Formiga pavimentando via

Planta em trabalho de parto

Lagarta alugando quarto

Pulgão demolindo caule

Chuva fabricando vale

A vida vibrante da anti-metrópole.

À Manoel importava o desimportante

Descarnava-se das materialidades

Para empreender em assuntos de quintal

Sob conselhos dos assessores alados

Empoleirados sobre a goiabeira

Ele não dava um pio, os acatava

Em matéria de jardim,

aprende-se a ser dono de nada.