Apanágio de Hasiah
O que quiseste dizer para mim, meu anjo guardião, quando em tenra infância apareceste-me de inopino, escoltado por Vésper pela vez primeira?
Tuas brilhantes vestes de prata ofuscaram meus olhos, ainda não poluídos pelo brilho enganador das coisas terrenas.
Fugi apavorado de tua presença, e de tua passagem, me lembro, carregaste o selvagem fogo, findando as minhas penas.
Em momentos cruciais, senti tua forte mão impedindo a ação da morte, tornando menos áspera a minha estrada, ajudando-me a superar barreiras.
Hoje, já de cãs prateadas, revejo-te em minha memória, e regozijo-me por estar a me proteger em todas as horas, em todos os dias dessa minha longa e atribulada jornada.
Não te cansas, meu anjo Hasiah, e nem tampouco reclamas do imenso trabalho que cuidar de mim deve dar.
Minha rebeldia é tanta que a mim mesmo amedronta: são insatisfações tamanhas, que não me atrevo a listar.
O que era definido ontem, hoje nebuloso está; minha cabeça é um palco confuso, Urano, regente e protagonista, contracena com a Lua, escorpiana e arrivista – Ufa! Que peça mais complicada.
Dificilmente, em nossos verdes anos, projetamos atingir idades longevas. Quase sempre somos pegos de surpresa ao ver a brancura da neve pintar os nossos cabelos, geralmente acompanhada da perda de vigor físico, que teima em nos punir pela total falta de previdência no conduzir de nossas existências.
Resta-nos, nessa etapa de vida em que a maturidade deve imperar, lançar uma vista de olhos ao nosso passado e extrair dele as lições para tornar melhor o nosso presente.
Carpe Diem.
Vale do Paraíba, tarde da Terceira Segunda-Feira de Abril de 2009
João Bosco (aprendiz de poeta)