Sermão da Montanha
Subi o monte.
Quase toquei o Céu.
Estava louco
por estar só.
Julguei
que a solução
era a solidão.
Procurei um abrigo.
Nem um beiral,
nem um curral
encontrei.
Passei a noite
ao relento
no meio do trigo.
No dia seguinte,
eu era o pedinte
mais pobre
e faminto
da grande montanha.
Cometera a façanha
de ficar só
uma noite.
No dia seguinte
da noite mais longa
da minha vida
procurei um abrigo.
Nem um beiral,
nem um curral
encontrei.
No dia seguinte
eu era o pedinte
mais pobre e faminto
da grande montanha.
Cometera a façanha
de ficar só
duas noites.
Ao terceiro dia
descobri
que a solução
era a multidão.
Desci ao povoado.
Era dia de festa.
Juntei-me,
mais a minha solidão
à maior multidão
que encontrei.
Era dia de festa
no povoado.
Montanhas de gente
sem rosto
passavam ao lado.
Montanhas de gente
a sorrir,
gozavam a festa
bocado a bocado.
No meio de gente
sem rosto,
quer vista de frente
quer vista de lado
descobri
que a solução
era a ilusão.
Deixei a multidão
onde estava.
Comprei um boneco
de trapos.
Com o corpo dorido
e alma em farrapos
sentei-me cansado
à beira do rio.
Fazia frio.
Procurei um abrigo.
Nem um beiral,
nem um curral
encontrei.
Passei outra noite
ao relento
no meio do frio.
No dia seguinte,
eu era o pedinte
mais pobre
e faminto
da grande montanha.
Acordei manhã cedo.
Sentado
na pedra vizinha
à beira do rio,
um amigo
sorriu.
Olhei-o nos olhos.
No dia seguinte
da noite mais longa
da minha vida
descobri
a solução.
Passei-lhe a mão
pelo ombro.
Olhei-o nos olhos
e pedi.
Amigo.
Anda daí.
Vem subir
o monte comigo.