Poéticos Desejos Fúnebres

Quando eu morrer não quero cravos sinceros, nem, tampouco, choros dispersos, prefiro os versos declamados sorrateiros e inquietos, acarinhando o meu putrefar;

Quando eu morrer evitem os boatos austeros, os sorrisos amarelos disfarçando incrédulo penar, prefiro as estrofes com esmero, advindas de corações embriagados com o poetar;

Quando eu morrer não quero ladainhas com pouca fé, nem missa ou novena em intenso alardar, prefiro as rimas que se assemelham a mais pura arte que há;

Quando eu morrer evitem chocosas cenas, gastos com pompa será vil problema, nada disso irá me agradar, distribuam cordéis em centenas, imprimam Neruda, Machado e Pessoa juntamente com o meu poetar;

Quando eu morrer não quero a nostalgia plena, os rituais por convenção que falseiam, estimulantes do insano chorar, prefiro uma ode na lapela, definição mais crua e bela do que é verdadeiramente o amar;

Quando eu morrer evitem pessoas que se aglomeram, urubus ávidos por mazelas entretidos com o meu velar, convidem os poetas amigos, familiares que se dão comigo, sussurro para todos transcendente recitar;

Quando eu morrer não quero demasiadas coisas, e evitem outras abundantes tantas, levo em prosa as singulares relutâncias, os sonetos das minhas intensas andanças, as crônicas dos meus divagares com esperança, os recitares com as reminiscências dos meus amares por herança, os declamares salutar e terna bonança;

Fúnebre criar que em poesia alcança os meus derradeiros anseios a serem insculpidos em meu mais que certo, inevitável, modesto, fervoroso, intenso e poético fatídico lapidar, desta forma sim, posso serenamente e tranquilamente descansar, morrerei como vivi, inebriado aos versos que me fizeram existir.

 
Poesia escolhida para ser publicada em Antologia Poética Nacional, Prêmio Sarau Brasil 2012.
O Poeta do Deserto (Felipe Padilha de Freitas)
Enviado por O Poeta do Deserto (Felipe Padilha de Freitas) em 24/11/2010
Reeditado em 16/03/2017
Código do texto: T2634251
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