O Louco

O Louco

=======ErdoBastos

Os homens, pelas calçadas

Os bêbados, nas portas dos bares

Os soldados nas paliçadas

As matronas em seus solares

Riem-se de mim, os atrozes

E eu só, a caminhar

Sozinho, a ouvir minhas vozes

Poucas vezes ainda, a cantar

Não me vêem, só jogam as pedras

E riem-se de mim, sem parar

Insultam-me em palavras severas

“Lá vem o louco a passar”

O que dorme nas ruas escuras

E come os restos doados

O louco, e suas amarguras

Vivem noutro mundo, fechados

Quando ao passar pela praça

Para todos,os pássaros cantam

Do louco, eles acham graça

E em revoadas se espantam

E sigo assim, o inútil, o desprezado

Tanto faz, se à noite ou de dia

Sempre só, de mim mesmo acompanhado

Nem um cão da rua me seguiria

Riem apenas, não sabem porque sou louco

Não sabem eles o que a vida me fez

Soubessem, não achariam pouco

Perder tudo assim, de uma só vez...

Abandonado, sem lar e sem fortuna

Doado foi tudo por um único amor

Traído, morta minh’alma à borduna

Hoje ouço a voz de um anjo falador

Nos bolsos, trago uns lindos poemas

Escritos em folhas de papel achado

Minhas mazelas, as dores e meus dilemas

Assim escritos, único tesouro salvado

O louco e seus papeis com poemas

Servindo de chiste aos passantes

Sob as árvores, em trapos apenas

Escrevo versos e frases delirantes

Não sofro, não choro mais nem lamento

Pois me fiz acompanhar da poesia

Ponho fora, passo ao papel o sofrimento

E ali volto a ter, o que me fez feliz um dia...

Em meus poemas há dores e tormento

Há fortunas, alegrias, suaves letras de amor

E sigo louco, dia a dia em meu afastamento

Da realidade enlouquecedora, que só me deixou a dor

Afasto-me, recuso toda ajuda ou tratamento

Sei, no fundo, que vivo à maneira certa

E vivo assim, exposto ao alheio julgamento

Ainda que visto como louco, sei-me apenas... um poeta