O Poeta e a Inspiração
Olá, há quanto tempo não me visitas
Estava a sentir falta de tua companhia
Seja à noite, à tarde ou durante o dia
Alegram-me as coisas por ti ditas.
Olá! Não estou longe tanto tempo assim
Sabes que estou em todo tempo e canto
Sabes que vejo o teu sorriso e teu pranto
Não podes queixar-te da ausência de mim.
Se estás assim tão onipresente de fato
E se me vês, pois, todo por completo
Por que não deixaste de lado teu recato
E vieste honrar a teu amante predileto?
Recato? Eu? Poupe-me caro amigo
Dou-me a quem julgo merecimento
E ausento-me por puríssimo castigo
A quem busca o meu aprisionamento.
Posso crer então em tua volubilidade
Pois a todos não tratas de forma igual
Não tens sentimento, és algo banal
E não almejas dos teus a felicidade.
Ora! Não me sejas assim tão patético
Eu a todos pertenço, mas não sou de ninguém
Não existo só para te dizer, submissa, amém
Além do mais, tens estado tão cético.
Perdoa-me! É que tua ausência me atordoa
E quando apareces, quero-te só minha
Porque és o rio para onde contínua se escoa
Minha existência nesta vida mesquinha.
Deixas de tanto e tanto queixar-te
O que fazias quando te vinha em pensamento?
Bem sabes que sou orgulhosa arte
Não podes perder meu passamento.
São da vida cotidiana as obrigações
Que me fazem perder tua passagem
E por vezes perco à revelia tua viagem
O que me causa tristíssimas emoções.
Atenta, pois, a toda vez que por ti passo
Prende-me e liberta-me no branco papel
O cérebro é prisão de onde fujo sem véu
E sequer posso deixar-te um mero abraço.
Ouço-te atento e por tudo agradeço
Mas vou deixar-te a outros iluminar
E quando desejares a mim visitar
Venha sem aviso, não precisas de endereço.
Virei, mas deixa aberta a porta de teu coração
Não a tranques com a fria chave do ceticismo
Estou sempre pronta, pois sou a Inspiração
E tu, para ter-me, não careces de preciosismo.
Cícero – 04-02-2011