O verdadeiro homicida / As quatro estações / Manto sagrado
O VERDADEIRO HOMICIDA
No chão em que piso não há mais flores,
Foram cruelmente devastadas pela guerra;
Restam agora somente os tristes horrores
Onde com a dor o sofrimento se encerra.
Campos em que outrora sorriam plantas
Choram miseráveis, mutilados e famintos;
Nem mesmo escapam as coisas santas
Do cruzado fogo dos canhões indistintos.
É a estupidez do poder, que em seu nome,
Mata os homens, as mulheres e as crianças;
Consigo traz a miséria humilhante da fome
E faz sucumbir corpos, almas e esperanças.
Imbecis dizem ser pela paz, a dor da luta,
Mas no sangrento campo de batalha
Só fica mesmo, pela vida, na dura disputa
O sangue de quem não é de verdade canalha.
Não é culpado o soldado que outro mata;
Ele é um homem que defende a própria vida
Por ordem d’outro que às de Deus desacata
Sendo, pois, este outro o verdadeiro homicida.
Cícero
AS QUATRO ESTAÇÕES
Conforma-te com o tempo e seu evoluir
Não tens mais de teus anos a primavera
Não podes, portanto, tanto insistir
Em fazer aquilo que um dia não quisera.
Não vives mais também o teu verão
E talvez só te reste como única saída
Controlar o desejo, reprimir a tentação
E guardar energias para o fim da vida.
Aproxima-se para ti o triste outono
E a bússola só aponta para o Norte
Conforma-te, pois, com o abandono.
Após caírem as folhas vem o inverno
E solitário, no calor de teu leito de morte
Dará início ao inexorável descanso eterno.
Cícero
MANTO SAGRADO
Vida! O que é esta coisa se não
Um mero aglomerado de matéria
Que desde o início da concepção
Já se sabe alimento de bactéria?
Todos os caminhos levam à morte;
Também os da paz e os da guerra
E sempre, com mais ou menos sorte,
Alimentam-se os vermes da terra.
Podes retardar ou não tua partida
Mas não deixarás nunca de sentir
O apodrecimento do que chamas Vida!
Veja-te, pois, numa cama de faquir;
Tendo a fria terra por estrado
E a mesma fria terra por manto sagrado.
Cícero