Tic-tac do novo dia

Um relógio toca o tic-tac do silêncio.

Pendurado com pêndulos parados na parede

Sem fluir tresloucado de loucos segundos

Sem momento

Carregando o fardo do instante interrompido

Fadado que está a não estar

Relógio de cuco encucado com os cactos

Que se tivessem olhos veria em seu deserto desolado

Imensidão árida no universo de engrenagens ocultas.

Um relógio, dois, sete mil relógios em silêncio

Onde o tempo incontável não se derrama

Parado que está aos ponteiros e aos pêndulos e aos cucos.

Ponteiros e pêndulos e cucos

Tão

Lentos

Tão

Lamentosamente

Lerdos

Atacando o próprio tempo no ato cão de não tic-taquear

Um emaranhado de muros de arame cresce

E quer engolir os dois relógios (eu disse dois?),

Os sete mil relógios tocando tic-tacs imaginários

Não escutado que é o tic-tac de um

Pelo outro (disse um único outro?)

Pelo seis mil novecentos e noventa e nove outros

Relógios sem movimentos

A cerca tosca de arame emaranhado como muro

Cresce como o medo dos estagnados

E a súbita consciência da vontade jamais tida

De ter pernas e asas

Mas os relógios se afastam dos relógios

E há quem tic-taqueie pelo ar

Tic aqui se ouve tac que responde tic

E dois agoniados pêndulos se carregam

Oscilando, enfim

Dois, como Astro-Norte e Astro-Dia

Dois como o existir e a esperança

Dois como os olhos do cavalo saltando pedras

Dois como os pés que cruzam a ponte

Pendurados na parede como andarilhos do tempo

Rachando a rocha

Alcançando o rio (segue incontável)

Dois únicos relógios tocam o tic-tac do novo dia

Ana Cristina - 06/96

Ana Cris
Enviado por Ana Cris em 22/02/2007
Código do texto: T389844
Copyright © 2007. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.