A lágrima que cai
Por que lamentas pela lágrima que cai de teu rosto?
Não queres sentir o desprezo e o desdém que vem com ela?
Antes a sinta como uma gota desnudada e fria,
Sinta o gosto salgado e sagrado do ouro em sua face.
Já não sois brisa em noite estrelada, nem recando para si mesmo,
Antes redemoinho, tufão, medo e angustia.
Por que tens medo de sentir aquilo que tu és?
Como podes tu esconder-se de si mesmo?
Tuas entranhas, teu corpo e teu dissabor te denunciam.
Eis covarde! Queixas-te por sentir a vida e a nega.
Negas a poesia, a tortura e o desalento.
Eis covarde! Isso é o que sois! Tens medo da luta.
Podes tu fugir para outro caminho que não seja a vida?
Podes tu ter medo do medo de sentir?
Ergue-se! Levanta-te! Deixa a lágrima cair!
Não espere compressões piedosas, nem acalento por tua lágrima,
Pois se queres saber ou não eu te direi:
Todos aqueles que dizem isso é melhor para você,
Na verdade e em verdade pensam antes em si mesmos.
Andas como trapo imundo mendigando amor,
Como se o amor fosse feito de migalhas, mas ele não é.
O amor é sentimento, paixão e desejo, não sobras.
Se as sobras do talvez fossem pelo menos esperança,
Dirias a ti que guardasse bem a caixa de Pandora,
Porque, talvez, esperança e fé andassem juntas.
Gritai para o mundo louvores de agonia e de dor.
Santificai teu corpo com oferendas perdidas.
Rezai aos santos que não te ouviram,
E deixais que os pregos furem tuas mãos e teus pés.
Amai o que não se podes amar, e detestai o que podes.
Foges dos covardes e amai o impossível,
E deixeis que os fracos morram com o fuzil na mão,
Para que não sejas tu somente a lágrima que cai do teu rosto,
Mas antes a vida, a própria vida.