Penitência

Olhem-me por inteiro

Percebam aonde chega alguém

Que violou a si mesma

Há renúncias em mim insistentes

Que em raízes contaminaram a existência

Lagartas deslizantes e envolventes

Não há brilho nessa figura que se transformou

Em cascas de uvas pisoteadas

As essências aos outros, o melhor

Servido nas salas em que não entrei

Sou apenas um número não incluído em primazias

Fiz o que não quis e a muitos agradei

Não disse meu sentir, calei-me

Fingi estar satisfeita

Blefei contra mim mesma

Mergulhei nos porões, não ousei

Rebaixei-me nos abismos dos montes que criei

Sobraram-me farrapos dispersos

Reduzi-me a súplica da clemência insistente

Corroída pelo remorso do desamor a mim mesma

Remanescentes dos desatentos diários

Sabor amargo que enjoa e

Caminhada em calvário

Percorro o mundo do abandono

Povoados de medos

Monstros que eu mesma lapidei primorosamente

A pedra se tornou resistente, um sepulcro

Em plena vida

“Mas não pude deixar de querer lhe mostrar o que pode acontecer com uma pessoa que fez pacto com todos, e que se esqueceu de que o nó vital de uma pessoa deve ser respeitado” Clarice Lispector