[ sem título #3 ]
I.
A casa
acordada de falas,
de cheiros,
de lençóis,
de grampos de varal,
de brisa
que não se percebe
mas se sente
nas folhas
do algodoeiro
cujas flores
não se vê
– senão
quando se busca
na lembrança,
nas entranhas,
d'um dia
mui anterior
e que
já passou
II.
A casa acordada
mas a rua
– e quem sabe
o bairro –
calada
como se buscasse
nas grades,
nos vizinhos,
no sábado,
nas borboletas,
no rádio,
nas visitas,
nas esquinas,
na Avenida dos
Trabalhadores:
um motivo
para que
se possa
despertar
e se misturar
à manhã:
Como uma cousa
compõe
a outra,
ou como uma cousa
está
em outra:
como uma mangueira
que mesmo
sem mangas
inda existe
como árvore
– e no entanto
suas frutas
e seus açúcares
fazem falta:
e no entanto
o marulho da rua
e do bairro
me fazem
falta
III.
O sonho
decerto vale
o sono;
ou vice-versa
Ou quiçá
o despertar
seja um preço
demasiado alto
a se pagar
Ou acaso
seja o pesado
cansaço
d'um povo
que movimenta
[o que
resta d] este país
IV.
Seria esse o motivo
de chamarmos esta
avenida
de Avenida
dos
Trabalhadores?
V.
Pensando
por esse
ângulo:
o sonho,
realmente,
vale o sono;
ou vice-versa