Repouso Sobre Ti Mais Uma Vez

Aqui estou, mais uma vez

Repousei a caneta sobre o papel e pensei em tudo o que poderia dizer

E poderia dizer tudo

Mas pouco de tudo me interessa

E a pouco tempo o meu pouco de tudo era você

Deveria então, lhe escrever?

Ou melhor, escrever sobre você?

...

Mas eu havia desistido

Havia deixado voluntariamente de lado esses textos

Pois já escrevi tantos deles

E tantos que leu

E tantos outros que nunca nem viu

Achei que te chateavam

Pois me chateiam as vezes

Mas você parece ver algo que eu não enxergo, então me metralha a cabeça

Poderia escrever todo o dia

Mas nem todo o dia tenho algo a dizer

Poderia repetir o que disse

Mas beiraria a insanidade

E olha eu de novo aqui...

Cercado dessas palavras que escrevi

Os muros que construi na estreita forma de poema disforme

Deveria falar sobre ti

Mas não me decidi

Não ainda

Então procuro driblar as palavras

Como um jogador de futebol (isso volta mais tarde)

Mas eu me embaralhei entre parenteses e não sei nem por onde continuar

Também, nem sirvo pra escritor

Não sei o que é advérbio, substantivo, adjetivo, pronome...

Mas uso todos

E se decido parar de escrever

Não encostar mais em papel e caneta

As sílabas escalam as paredes da minha cabeça (minha casa)

Procuram as janelas dos meus olhos

E transbordam em ideias que já foram pensadas

Em frases que já foram ditas

Em pessoas e coisas que sempre retornam, vez ou outra

Então sou obrigado a jogar essa partida de futebol

Mesmo sendo péssimo

Posso dizer até que, pra zagueiro, eu sou ótimo escritor

Mas sinceramente, sei que no fundo não sou nada disso

Não sou atleta

Não sou filósofo

Não sou escriba

Não sou músico

Nem mesmo poeta

Não sou nada disso e mesmo assim insistem em dizer que sou (só eu disse)

Porque escrevo

Porque penso

Porque faço frases bonitas

Combino sílabas (oxitonas, paroxitonas e proparoxitonas) em jogadas e passes

Como os daqueles que jogam futebol e driblam (eu disse que voltaria)

E encantam a todos

Invento várias versões de mim mesmo

Minto pra vocês

Minto pra você

Minto pra mim

Mas no fim

São todos pedaços de mim

Galáxias completamente distantes e diferentes

Algumas mais perto que outras

Mas todas igualmente insignificantes

Quando estão esquecidas

Por isso me faço ator

Me faço músico

Poeta

Escriba

Atleta (não, isso não!)

Por isso escrevi mais uma vez

E mais uma vez me perdi em palavras

Num tema central, como chamam

Título, nem escolhi (contrariando a minha professora de português, é sempre a primeira coisa que escolho)

Não sei bem onde as palavras vão me levar

Elas me arrastam pra lá e pra cá

E repousam em você.

E costumavam repousar...

Quando eu estava alucinado

Quando você bagunçava a minha cabeça

Quando contradizia o que dizia e repetia a contradição, contradizendo o que disse

E contra tudo foi e era e é

Mesmo que menos

Bem menos...

E eu perdido e vagando

Vagabundeando, pra ser sincero

Olhei pra você e vi

Pensei em você e percebi

E então abriu-se a válvula: e foi daí que as sílabas passaram a me perseguir

Assim como eu perseguia a tua atenção

Assim como a atenção do poeta persegue a musa para a inspiração

Mas não vou nem começar, com você a coisa é outra

Você é áspera

Irreal e centrada no chão

Você diz e faz e fala coisas

Não é muda, não diz verdade absoluta

Mas já reinou sobre minha cabeça

E olha eu aqui de novo, mais uma vez tecendo linhas sobre ti

Marcando rítmo e rima

Dançando a dança da galinha

E percebendo que...

O que quer que eu escreva, vocês vão ler. Você vai ler. Pois eu cuido desses textos como cuido da minha casa (e você já ouviu isso em algum outro poema).

Desculpa.

é que eu não me canso mesmo...