Borboletas

Há borboletas voando pela cidade. É outono e as folhas caem.

Elas voltejam ao meu redor, trazendo-me uma onda de graça e paz. Seres tão leves e cândidos que flutuam no ar e enchem a vida de amor.

As pessoas andam,sorriem,choram, se beijam, se abraçam, se amam sem nem se quer reparar na presença celestial das pequeninas borboletas.

Em meio aos carros, casas, fábricas, ônibus, prédios e ruas elas voam felizes. Batem as asinhas... Asinhas de borboletas, leves e perfeitas!Vão batendo as asas e flutuam junto com o vento.

Batendo os braços rapidamente saí pelos passeios e ruas correndo atrás delas. Desejando libertar-me, voar e sorrir saí com o grupo das coloridas borboletas. Eram azuis, verdes, amarelas, pretas, laranjas e brancas. Eram alegria, felicidade e paz.

As pessoas pararam de beijar, de abraçar, brigar e amar para me olhar. Tudo parou e todos pensaram ser mais um caso de loucura.

Uma menina correndo e batendo os braços pensava que era uma borboleta!

Deixei-me conduzir pelo encanto que a presença delas me dava e esqueci do mundo além de mim e delas.

De repente eu estava num bosque, acho que era um bosque. Existiam árvores grandes e de folhas verde escuras. Havia grama cobrindo todo o chão. Ainda sentia debaixo dos meus pés a umidade do solo.

Num tronco caído havia uma pequena lagartinha que andava devagar e paciente.

Abaixei-me ao chão e a observei. Ela caminhava para a outra ponta do tronco, que parecia ser infinitamente distante aos seus passos.

-Ah, mais que bela lagartinha!Lagarta que percorre seu caminho, que sem pressa caminha para seu destino!Oh lagarta, daí para mim a tua calma, a tua paciência!Dai para mim a certeza dos teus passos, a paz dos teus feitos.

Era uma pequena lagarta que caminhava diante de um tronco imenso. As pessoas lá fora corriam sempre em busca de algo. Corriam desesperadamente com o medo da morte, com o medo da vida, com o medo de algo. E a pequena lagarta se movia lentamente, como se a vida fosse eterna, como se não existisse o amanhã, como se não houvesse o que temer!Um humano vive até 78 anos no geral e uma lagarta muito menos de 10 anos, entretanto caminhava sem a pressa do viver!Tinha o seu desafio e não olhava para trás e nem se angustiava diante a demora dos seus próprios passos.

-Ah pequenina lagarta... Quero ser você hoje, sempre e amanhã!Quero ir em frente sem o medo, sem a angustia e com a certeza de que este é meu passo e só posso dar um de cada vez, para não atrapalhar-me e morrer antes do tempo certo.

A olhei mais um pouco e levantei do chão.

Um beija-flor azul marinho apareceu e voou até as flores que lá havia.

Havia lírios, rosas, violetas, margaridas e girassóis.

Com a sutil agilidade de um animal aproximei-me dele, sem o espantar e o observei.

O beija-flor batia as asas rapidamente, não me dando a chance de contar quantas por segundo. Seu bico longo introduzia-se na flor que se abria diante dele.

-Beija-flor que o néctar recolhe, ensinai-me a recolher da vida os seus amores. Beija-flor que ama a flor, dizei a mim o que fazer diante da vida!Dizei-me meu belo mestre como sugar do tempo os seus ensinamentos e lições. Dizei a mim como tomar do mel da poesia e viver da graça do versejar!Oh meu nobre beija-flor, que de flor em flor cata o seu amor, beijai a minha alma para quem sabe dela florir alguma rosa, lírio ou jasmim!

Depois de sugar o néctar das belas flores ele voou e foi-se com o vento.

As borboletas ainda voavam felizes e inocentes em redor das arvores, flores e de mim. Eram lindas e graciosas.

Um arco-íris formou-se no grande céu límpido e azul. Um céu de paz, de amor, cheio de cor.

Sentei na grama e respirei fundo fechando os olhos.

Deus criou a terra, o mar, os pequenos insetos e flores. Deus criou a mim, a eles, a nós... E, no entanto somos tão diferentes dos pequeninos animais!

Ó meu Deus o que perdeu-se em nós?O que se perdeu nesta grande caminhada?Ah meu senhor, quem dera ser-me como os animais!Quem dera ter na mente a inocência da vida, a graça do viver e a paz do existir!Um rio que de águas puras enche uma fonte, um rio que só de peixes se enche... Ah, um rio!Um rio puro e santo assim eu quero ser!Purificai a minh’alma para só dentro de mim nascer as terras santas e frutíferas!Purificai o meu ser para que de mim só saiam alegrias, poesias e saber!Fazei de mim um ser diferente, simples e quebrantado para que a todos eu possa cativar e que a todos eu consiga amar. Que eu ame a vida, o destino, o caminho e as pessoas!Que eu ame o que vive, o que nasce e o que morre!Que minh’alma se entristeça nas infelicidades alheias e se alegre na alegria do meu próximo!Que eu venha ter nos lábios sempre um sorriso sincero e infantil, e que sempre tenha nos olhos a paz e o amor que de ti flui!

E de olhos fechados eu senti. Senti o inexplicável e o sublime ato de ser tocada, de ser abraçada e de ser amada por um ser superior aos que estão na terra!

Eu não chorava, nem sorria, nem me entristecia. Eu podia voar, podia dançar, podia flutuar!

Não, eu não flutuava, nem voava!Mas minh’alma estava além dos grandes montes e tocava os grandes céus!

Abri os olhos e uma borboleta havia pousado no meu joelho. Ela estava parada, quieta, a olhar-me.

Abriu as asas e bateu até chegar a meu rosto. Ficou alguns segundos a fitar-me e saiu voando.

Fechei os olhos e quando abri eu estava em meio à rua.

As pessoas tornavam a correr, tornavam a andar. Os carros passavam, os prédios erguiam-se querendo tocar o céu e não havia mais grama a não ser asfalto.

Tirei o fone do ouvido e o ônibus deu partida. Olhei pela janela e Um beija-flor passou correndo por ali.

Sorri, olhei pela janela para o céu meio cinza (cheio de gases poluentes) e agradeci por estar viva e por estar ali!

15/04/08