O Urubu

 

O urubu voa alto e avista uma possível carniça.

É um homem alto atolado na areia movediça .

O urubu se aproxima e espera o melhor momento.

Aterrissa em cima de um galho e observa o alimento.

 

O homem move-se loucamente, quer sair da lama.

O urubu vê a morte nos umbrais de quem lhe chama.

O homem não quer a morte, pela vida quer a luta.

Da lama o homem se desvencilha, e a morte não o mata.

E o urubu disse: "um dia serás carniça!"

 

O urubu novamente bate asas rumo ao céu.

De cima, nas nuvens, vê um homem baixo de chapéu.

O homem preso às ferragens de um acidente terrível.

O urubu pousa em cima do capô do automóvel.

 

O urubu olha para o homem que a morte insiste em demorar.

O homem olha para o urubu cuja a morte quer devorar.

Ouve-se o som da ambulância, o urubu sai, se espanta.

O homem é retirado com vida e se levanta.

E o urubu disse: "um dia serás carniça!"

 

O urubu, lá de cima, gira em torno de um homem louco.

Esse homem se perdeu da vida, tornou-se algo pouco.

O urubu aterrissa no epicentro da fumaça.

O homem quase morto, somente o couro e a carcaça.

 

O homem magérrimo tem pouca carne para comer.

O urubu olha para o drogado sem muito lhe querer.

Mas eis que chega a família e o socorre da pedra.

É levado ao lar, local onde ele se medra.

E o urubu disse: "um dia serás carniça!"

 

Lá do alto, muito alto, o urubu observa um homem muito estranho.

Cambaleante, não dá para saber seu tamanho.

O urubu aterrissa num engradado de bebida.

E vê o homem se desfalecer na subida.

 

O urubu sente o cheiro da morte e espera a carniça.

Não vê a hora de matar a fome, a ânsia lhe atiça.

Eis que chega um corvo e pousa sobre o corpo do homem.

Começa a devorá-lo. O corvo e o homem se consomem.

 

O urubu apenas observa. Espera a carniça e a carcaça.

O corvo estaria a espreita nos umbrais da desgraça?

Quem era aquele homem que às entranhas do corvo se foi?

Seria o famoso poeta Edgar Allan Poe?

E o urubu pensa: "Deus me livre do corvo!"

“Disse o corvo: Nunca mais!”