Sina de menino

Quando a luz materna cegava

Eu fechava os olhos desde cedo,

O dia passava e eu não nascia;

Até que a noite chegou.

Ela era linda e tinha seus encantos;

Saí, como pra comprar cigarros;

Voltar logo; mas descobri o pior.

Tinha que ficar aqui fora...

Até que o dia raiasse tórrido;

Boca sedenta de trabalhador,

Com seus relógios de ponto

E os patrões com a inconsequente

Dolorosa e necessária mais valia,

Produto da preguiça de pensar.

Encontrei seres racionais

Que não usavam a razão pra nada.

Vi u’a multidão caminhando às cegas,

Apalpando o vento com as mãos;

Não enxergava um palmo do nariz.

Atrás dos imensos e insensíveis muros

Viviam outros seres desconfiados;

Eles espreitavam pelas frestas;

Quando saíam das tocas, tinha carros

Tão blindados quanto os seus corações;

Levavam uma sopa azeda e estranha

Para os bairros dos emagrecidos

E julgavam receber a recompensa

Do grande arquiteto universal,

Num espaço de futuro incerto,

Quando a luz que lhes emprestaram

Se apagasse para um novo renascer.

Porém, o que não sabiam é que,

Todas as vezes que fizessem o bem,

Teriam que olhar além do aquém;

Talvez fosse mais fácil beijar alguém.

Os sábios discutiam suas vãs filosofias

E, com o tempo, nada mais fazia sentido;

Procurei voltar para a toca sagrada,

Porém ela estava fechada.

Disseram-me para esperar a hora

Em que a vida desse conta da sina.

Esperei na esquina do destino.

Enfim ela chegou e descasei de novo.

Carlinhos Matogrosso

carlinhos matogrosso
Enviado por carlinhos matogrosso em 28/12/2013
Código do texto: T4628401
Classificação de conteúdo: seguro