Medo
O medo é o que me define
Não a dor, nem a angustia
O rubor em frente àqueles
Penosos e odiados seres
Dá-me medo até morrer!
E, por fim, só e amargurado
Dê-me da bebida mais um trago
- Brindaremos à nossa covardia
Que muito nos traz o amargo
Então, que venha o esquecer!
A estranha e ávida conclusão
Faz-me ver o que é real
A par da imoral convulsão
Que aos fatos se fez leal
E fez-me agora arrefecer!
O medo de tocar a sua tez
Rígida e terna como a era
Olhar-te no fundo dos olhos
Vendo a ilusão que pondera
A eterna busca por você!
Os diabos que nos habitam
São nossos pecados, ditam
O bem e o mal dentro de nós
Não podem se sair bem a sós
Dividem o bem e mal querer!
Inexiste a flor do meu ser
Diante dos que estão a ver
Minh ’alma por inteira nua
Como cartas jogadas à rua
Tão espontâneo o meu viver!
A honra e alegria dos milhões
São dos homens teus colhões
Vividos e viris que bem afirmam
O poder de não temer, diriam
Mesmo a dor ou o nada ter!
Mesmo o espaço a nos rondar
Estrelas, que fogem do contar
Que nos fazem ser um estilhaço
Perto de tudo, pequeno pedaço
Mesmo o soar da ignorância
Expondo sua forte arrogância
Por vezes, em mais alto som
Que o soar do justo e do bom
Mesmo o penar do inocente
Que o mais triste fardo, sente
Culpado pelo olhar do injusto
Com tamanha honra no intuito
Mesmo ter que vagar sozinho
Não ver ninguém no caminho
Da solidão, então, se alimentar
E só, ver o mundo por ti passar
Mesmo o inglório e vil destino
Dos que amam como meninos
Aquelas que tampouco olham
Os que, bem no peito, moram
Mesmo a lembrança indevida
Tão boa, quando esquecida
Que nos vem à tona solene
Trazendo-nos a dor perene
Mesmo o medo de se temer
Um momento que venha a ser
O medo de ter medo é cruel
É a linha entre o inferno e céu
Mesmo o conhecer da morte
A inevitável fraqueza do forte
A efemeridade deixa a vida ser
Vã como um instante de prazer.