Às vezes a fome da montanha
Às vezes a fome da montanha
cresce em mim como álacre
e faz-me abrigar
num rio de verdes águas
Recolho-me na noite como o alcatruz
no fundo negro dum poço
ou como o alcatraz na concavidade agreste
dum rochedo, até germinar
do húmus da terra
e do borbulhar das águas
o fogo do sol
Como o búzio espera o som
nas areias da praia esquecida
ou a terra espera o fruto para crescer
após arada assim espero a palavra;
depois
como o oleiro ao barro
modelo-a,
como o escultor usa o cinzel,
limo-lhe as arestas
como o artesão na forja
uno-lhe os espaços vazios
esculpo-a
amo-a,
e construo dela o meu edifício todo
_______
Alvaro Giesta in Um Arbusto no Olhar (Calçada das Letras, 2014)