ELA

Às vezes ela vem de supetão como as chuvas de verão.

Outras vezes vem se insinuando como uma gata

se enroscando nas pernas do dono.

Acontece em qualquer lugar:

na cama, no elevador, no carro, no escritório.

Deixo-me possuir por sua força aparentemente frágil.

Não ouso pronunciar nenhuma palavra

porque ela exige apenas o movimento das mãos

e dos lábios os suspiros de prazer.

No início minha timidez a inibia.

Ela respeitava os meus limites.

Na verdade a sua presença me deslumbrava e me assustava.

Eu mal conseguia respirar, a minha mão tremia.

Sabiamente ela se ausentou por um longo tempo

para que meus dedos se fortalecessem

e eu perdesse o medo de assumir a relação.

Hoje eu gosto quando ela me assalta no meio da noite

e vira meu mundo de cabeça pra baixo.

Ela derrama seu perfume em todas as fendas do meu corpo

assim como a água se infiltra nas fissuras de uma velha construção

e faz cair no asfalto estruturas superadas.

Como dois grandes mestres do xadrez

adiamos algumas vezes o nosso jogo

para aumentar o gozo no final.

Quando ela vai embora abraço de novo a solidão

e contemplo satisfeito o fruto da nossa união.

Registro a poesia em meus cadernos borrados

E espero então a volta da minha musa:

A volta da inspiração;

henrique ponttopidan
Enviado por henrique ponttopidan em 14/02/2018
Código do texto: T6253987
Classificação de conteúdo: seguro