Culto a Chronos

Onipresente e imensurável!

E infinito até que por fim te acabas(para os mortais)

E eu aqui tentando alcançar-te e apanhar-te no ar

Embora sempre me escorregues das mãos suadas

Enquanto estou aqui sentado, escrevendo e procurando

E te perdendo e te encontrando novamente

Já te perdi e encontrei tantas vezes

Para depois finalmente perceber que, na verdade,

Só posso te encontrar quando eu te esqueço

O que parecia tão onipresente, imensurável e infinito

Pode ser que eu nunca tenha vivido, como os amores inventados

De ti eu fiz um unguento na esperança de esquecer

De toda a dor- e o fiz porque me prescreveram os sábios

Quando me disseram que o tempo é o melhor dos remédios

Esqueceram-se de estipular por quanto tempo deveria tomá-lo

E quando vi estava tomando a caixa toda rápido demais;

E quando vi não sabia se estava tomando ou jogando fora

Lembro-me das tantas vezes em que te matei

Friamente para que renascesses como eu queria

Ainda que infelizmente percebesse que tua vida é uma só

Como tu sangravas calado e rápido

Outras vezes resistias firme e me fazias ver o assassino que era

Nas noites eternas em que me mantinhas acordado a noite toda;

Nas noites que eu quis que fossem eternas;

E mesmo nas que foste eterno contra a minha própria vontade

Pobre infeliz e amaldiçoado tu és!

Apanhas de todos, e ainda assim para todos crucial tu és!

E eu que sou um dos teus cultuadores

Tenho grandes planos para tua velhice

Ainda que sejam tão reais quanto o resto da tua vida

E eu te maltrate com a mesma ou maior intensidade

Que os infelizes que passam na vida sem perceber tua grandeza

Não sou nem me considero superior a nenhum cachorro

Pois eles te mordem e te cheiram sem nenhuma ambição

Sem se preocupar sempre em te perderem de vista

Sem lamentar que o sol se pôs e passaram o dia roendo o osso

Não sou nem me considero superior a nenhum indigente

Pois eles vivem a vida nua e crua todos os dias

Sem inventar inimigos imaginários para roer

Sem ter tempo para se perder em divagações vazias

Continuo aqui sentado a escrever na expectativa

De que possa guardar um pouco da tua essência

Enquanto isso de novo tu passas por mim em círculos

De novo lá estou eu a te pedir e a perseguir meu próprio rabo